RESUMO DO TRABALHO
Apesar da
aparente guinada mundial em direção a um conservadorismo ideológico com
desprezo aos direitos humanos, retirada de políticas públicas em defesa dos excluídos, a percepção da existência de direitos humanos fundamentais
já está consolidada em nossa civilização há bastante tempo bem como a noção de
que eles têm que ser efetivos e eficazes. A visão moderna é no sentido de que
cabe ao Estado proteger e promover os direitos humanos com as políticas
públicas, obrigado que é pelas normas e pelos princípios jurídicos fundamentais.
A Constituição de 1988, nossa norma fundamental, é eminentemente
principiológica, e seus pilares básicos são o princípio da dignidade da pessoa
humana, da solidariedade social e da isonomia e, com isso, ela ampliou a tutela
do Estado para com o cidadão e os direitos humanos deixaram de ser um serviço
público discricionário para ser um direito efetivo. Além disso, previu-se
textualmente a possibilidade da Administração Pública ser responsabilizada
civilmente por ações e omissões que causem danos ao cidadão, com seus órgãos e
agentes devendo indenizar os prejuízos que causarem aos particulares no
exercício da atividade administrativa. O Poder Judiciário, como guardião da
Constituição, está comprometido com esta efetivação. Ele deve punir o Poder Executivo, seus membros e seus órgãos, responsáveis diretos pela Administração Pública seja por
ação que cause dano ou seja por omissão injustificada utilizando e para isso o
instituto da Responsabilidade Civil. Com isso vai fazer Justiça no caso
concreto, promovendo indiretamente a Justiça coletiva.
INTRODUÇÃO
Atualmente, os meios de comunicação
social divulgam a existência de grave crise econômica mundial o que tem
provocado desemprego em massa para um enorme contingente de trabalhadores.
Informam-nos também do incremento das agressões ao meio-ambiente com aumento da
poluição ambiental e destruição de ecossistemas, colocando em risco a
sustentabilidade da atividade e da vida humana no planeta. Divulga-se também quase que diariamente casos de
corrupção de servidores públicos em valores
financeiros na casa dos bilhões desviados e enorme quantidade de pessoas envolvidas, prejudicando os
negócios e propiciando uma concentração de renda mundial nas mãos de poucos, em
detrimento da miséria de muitos. Isso sem falar nas populações de continentes
inteiros que estão mergulhadas na miséria, nas doenças e nos conflitos bélicos,
sem perspectivas de mudanças, o que nos indigna e desafia ao mesmo tempo. Sem falar nos milhões de refugiados políticos e econômicos, atores de uma tragédia anunciada.
Apesar desses problemas, atesta-se
facilmente que o mundo caminha para um desenvolvimento civilizatório, uma
evolução social globalizada nunca antes imaginada e causada principalmente pela
admirável evolução das ciências, da tecnologia e da economia mundial nos
últimos anos, tornando a vida humana muito mais fácil no planeta. Recentemente,
inclusive, divulgou-se que há a previsão de alguns cientistas de que os
recém-nascidos deverão viver um século de idade devido à evolução da ciência
médica cada vez mais capaz de propiciar um envelhecimento longo, digno e
produtivo.
Como visto acima, apesar do grande
desenvolvimento econômico, progresso cientifico e evolução social atingido pela
humanidade, estes não são socializados, generalizados ou democratizados. Muitos
Estados que deveriam ser os motores ou os animadores do desenvolvimento e bem
estar nacional pouco fazem para que estes cheguem efetivamente aos cidadãos. Ao
contrário disso, muitos países que consagram o desenvolvimento e os direitos
humanos em suas Constituições os desrespeitam acintosamente, seja de forma
comissiva ou omissiva como a proclamar a impossibilidade ou a ineficácia de um
Estado efetivo e dirigente.
No caso do Brasil, a Constituição de 1988
ampliou de forma nunca antes imaginada a tutela do Estado para com o cidadão.
Nela, os direitos humanos como direito a saúde, a educação, a moradia, cultura,
segurança e lazer, dentre outros, deixaram de ser um serviço público
discricionário para ser um direito efetivo do cidadão, diferente das
constituições anteriores, comprometendo todas as unidades federativas em
competências comuns a respeito desses direitos. Ela inovou quando determinou
como seu fundamento a cidadania e a dignidade da pessoa humana, quando declarou
entre seus objetivos a solidariedade, a justiça e a erradicação das
desigualdades sociais e quando previu várias ações constitucionais que
possibilitam efetivação de seus preceitos programáticos e a tutela dos direitos
sociais. A Constituição atual é uma Constituição comprometida com os direitos
humanos elegendo a dignidade humana como grande principio norteador e prevendo
os meios concretos de sua efetivação.
Além disso, previu-se textualmente a
possibilidade da Administração Pública ser responsabilizada civilmente por
ações e omissões que causem danos ao cidadão, com seus órgãos e agentes devendo
indenizar os prejuízos que causarem aos particulares no exercício da atividade
administrativa. Conforme a Constituição em seu art. 37 § 6º:
As pessoas jurídicas de direito público e as de direito
privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus
agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de
regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Fazendo um apanhado histórico do
instituto da responsabilidade civil, já existiu no passado a teoria da não
responsabilização do Estado pelos atos praticados pelos agentes que causassem
danos aos particulares. Existiu a teoria da responsabilidade com culpa do
Estado, chamada de subjetiva, segundo a qual existe a obrigação de indenizar
apenas se os agentes tenham agido com culpa ou dolo. Existiu também a teoria da
culpa administrativa pela qual é dever de o Estado indenizar o dano sofrido
pelo particular somente no caso de comprovada existência de falha da atividade
administrativa (o serviço público não funcionou ou funcionou mal e causou
dano). Por fim, existe a teoria do risco integral, que jamais foi acolhida no
Brasil, por meio da qual basta que exista o dano para que surja a
responsabilidade civil, mesmo que o dano decorra de culpa exclusiva do
particular. A teoria do risco integral jamais foi acolhida em quaisquer das constituições
republicanas brasileiras.
No Brasil, adotou-se a responsabilidade
objetiva do Estado e, para ela acontecer, basta apenas a existência do dano e
do nexo causal entre o dano e a conduta do agente público. Mesmo o
concessionário ou permissionário de um serviço público vão responder
objetivamente perante os usuários. O Estado responde objetivamente ainda que o
serviço público seja prestado por um delegatário do Poder Público e ainda
responde civilmente por omissões.
Percebe-se que houve uma grande mudança
de paradigma com a transformação que aconteceu com a compreensão da
responsabilidade civil do Estado. Foi um instituto pertencente, na origem, ao
Direito Privado e agora passa a ser aplicável ao Direito Público. Isto acontece porque desde a Antiguidade
existia a dicotomia clássica entre o Direito Público e o Direito Privado e
competia ao Direito Público apenas garantir e efetivar a aplicação dos direitos
fundamentais, isto é, os direitos de primeira dimensão, primordialmente o
direito a liberdade e o direito a propriedade. E ao Direito Privado competia a
regulamentação da relação entre particulares, sem a intervenção estatal,
reinando em absoluto o princípio da autonomia privada, desconsiderando qualquer
desigualdade que concretamente poderia surgir. Portanto, privilegiava-se o
indivíduo como titular de direitos, desvinculados de suas relações sociais. Era
o homem apenas objeto das relações jurídicas.
Na sua origem, a codificação das leis
surgiu como a maneira de generalizar certas orientações importantes para a
sociedade, a fim de que esta as compreendesse em sentido idêntico. Dessa
maneira, em tese, oferecia segurança e uniformidade de comportamentos,
principalmente entre os particulares. Em consequência, o centro do ordenamento
jurídico passou a ser o Código Civil, reduzindo a Constituição a mera lei
orgânica positivada. Inclusive tinha maior importância do que a própria
Constituição, por trazer maior segurança às relações entre os homens. O Direito
Civil codificado seria autossuficiente, não necessitando de outros textos para
solucionar os conflitos.
O Código Civil era considerado um sistema
fechado, axiomático dedutivo, gerando a autossuficiência do Direito Civil até
recentemente. A interpretação e aplicação do direito não era de forma
valorativa, mas apenas formal, resumindo-se em isolar o fato e aplicar a norma,
sem qualquer ingerência de valores sociais. Era o racionalismo jurídico, sendo
o juiz mero aplicador da lei. Logo, impossível, ao ver da época, uma
inter-relação entre os Direitos Fundamentais e o Direito Privado, o que existia
era tão somente uma hierarquia formal entre a Constituição e o Código Civil.
Esta ordem jurídica provocou, porém, profundas injustiças individuais e sociais
fazendo surgir as grandes revoluções e guerras mundiais que mudaram a situação
mundial.
Atualmente, as Constituições
contemporâneas deixam de ser um conjunto de normas que contém apenas elementos
de Direito Público mas preveem também as relações entre os particulares.
Exemplo disso é a nossa Constituição de 1988 onde seu Titulo I refere-se aos
princípios fundamentais, o Titulo II aos direitos e garantia, o Titulo VII
estabelece disposições sobre a ordem econômica e financeira e o Titulo VIII
sobre a ordem social constituindo, assim, um verdadeiro corpo normativo de Direito
Privado. Há também a previsão da Responsabilidade Civil do Estado por ações e
omissões com obrigação de indenizar. E previu a tripartição de poderes ou
funções do estado com o poder judiciário como guardião da constituição.
Com isso, apesar de existir certos Poderes da República responsáveis diretamente pelas políticas públicas, como o
Poder Executivo e o Legislativo, conforme previsão constitucional, o Poder
Judiciário como guardião da Constituição também está comprometido com esta
efetivação. Ele pode obrigar o Poder Executivo e seus órgãos a determinadas
práticas como indenizar por ações e omissões no seu múnus público, fazendo
Justiça no caso concreto ao cidadão prejudicado pela Administração Pública.
O fundamento do instituto da
Responsabilidade Civil está no fato de que todo dano merece ser indenizado. A
Responsabilidade Civil nasce de uma necessidade da sociedade na busca de um
equilíbrio nas relações humanas pois não se pode aceitar que o causador de um
dano fique sem qualquer consequência ou punição por seu ato danoso e, tampouco,
que quem sofre o dano deva ficar sem qualquer reparação ou compensação.
Portanto, a Responsabilidade Civil abrange tanto um aspecto jurídico quanto
moral.
Com relação à Responsabilidade Civil do
Estado, negar uma indenização pelo Estado ao cidadão por seus atos
administrativos que causem danos, ou devido à omissão desses atos, é subtrair
do poder público a sua função primordial de tutelar o direito e proteger a
justiça. A responsabilidade civil do Estado passa para o campo do direito
público, com base no princípio da igualdade de todos perante a lei, pois entre
todos devem ser distribuídos equitativamente os ônus e encargos. Se o dano foi causado pelo Estado, e este
atua em nome da sociedade, então a responsabilidade acaba sendo desta, que deve
suportar os custos pelos prejuízos, que, por conseguinte, serão distribuídos,
indiretamente, a cada indivíduo. Assim, a justiça fica restabelecida, uma vez
que o dano causado a um terceiro será absorvido por toda a sociedade.
O Estado pode ser definido como uma
comunidade humana fixada num território e que, dentro das suas fronteiras,
institui uma forma de organização do poder político soberano com o fim de
garantir a segurança, a justiça e o bem-estar econômico e social. As funções do Estado Contemporâneo, entre
outras, são as funções políticas que visam promover a paz social, gerindo a
administração pública e aplicando os recursos na satisfação das necessidades
coletivas. São também as funções sociais que objetivam promover a melhoria das
condições de vida e de bem-estar da população. E por fim, são as econômicas,
pretendendo-se estabilizar a economia, garantir o seu bom funcionamento e
promover o crescimento e desenvolvimento econômico.
O Estado deve promover a eficiência, a
estabilidade e a equidade. Deve assumir-se como dinamizador, regulador,
planificador e fiscalizador da atividade econômica. A Administração Pública
engloba o conjunto de serviços aos quais compete desempenhar as atividades
tradicionais do Estado. Não visam ao lucro mas a satisfação das necessidades
coletivas como saúde, educação, segurança etc.
Por seu turno, a Constituição atual, que
tem a função de organizar o Estado, é uma Constituição claramente comprometida
com os direitos humanos. Ela elege a dignidade humana como grande principio
norteador e prevê os meios concretos de efetivação, principalmente através do
Poder Judiciário. E previu inclusive a responsabilidade civil da Administração
Pública com seus agentes devendo indenizar os danos que causarem aos particulares
no exercício da atividade administrativa.
Também chamada de Responsabilidade Civil
do Estado, a Responsabilidade Civil da Administração Pública é objetiva,
prescindindo de dolo ou culpa. Existindo o dano e existindo o nexo de
causalidade entre a atividade administrativa e o dano sofrido pelo particular
surgirá a responsabilidade civil da Administração. Trata-se de positivação da
teoria do risco administrativo, por meio da qual se fundamenta que ao exercer
sua atividade, o Estado cria riscos que deve suportar. Assim, mesmo no caso de
funcionamento correto da atividade administrativa, poderá existir
responsabilidade civil do Estado ou das pessoas jurídicas de direito privado
prestadoras do serviço público no caso de ação ou omissão que cause dano a um
indivíduo.
Assim, é correto dizer que apenas deve
ser comprovado o nexo causal entre o dano e a conduta do agente público para
haver direito a reparação. Não só o concessionário, o permissionário ou o
delegatário de um serviço público responde objetivamente perante os usuários do
serviço público mas qualquer servidor público responde objetivamente apor suas
ações e omissões.
Este é o Estado Democrático de Direito
onde se busca a justiça material e a efetividade prática dos direitos humanos.
Ele é marcado pela superação da dicotomia clássica entre Direito Público e
Direito Privado pois as instituições do Direito Civil vinculam-se
progressivamente ao Direito Público em um mundo econômico e jurídico cada vez
mais inter-relacionado. A funcionalidade e, sobretudo, a eficácia do Direito
Privado, exigem essa correlação. A ordem pública e a comunitária e, portanto,
todas as entidades públicas e privadas encontram-se diretamente vinculados pelo
princípio da dignidade da pessoa humana.
Na época atual de grave crise econômica
mundial todos os Estados são chamados a intervir mais fortemente nas suas
economias, seja no nível macroeconômico ou microeconômico. Isto para promover o
crescimento e o desenvolvimento nacional através de ações de planejamento e
mesmo prestar direta ou indiretamente os serviços de que o povo necessita se
tornam imprescindíveis. Daí que a possibilidade de responsabilizar o estado e
seus agentes por ações danosas ou omissões em suas funções vai se tornar um
importante mecanismo para qualquer cidadão garantir seus direitos básicos
essenciais. Ou ao menos uma justa compensação financeira por eventos danosos ou
omissões injustificáveis que lhe cause prejuízo.
Por outro lado, percebe-se nos noticiários
políticos um grande aumento das notícias de corrupção de servidores públicos
que deixaram de lado o interesse público em nome de interesses particulares com
desvios de verbas pública aos bilhões de reais quando não a simples malversação
de dinheiro público por imprudência, negligência ou imperícia. Estes poderiam e
deveriam ser responsabilizados civilmente por suas ações e omissões.
Por todo o exposto, salta aos olhos a
importância e a atualidade do trabalho em questão. É grande a
irresponsabilidade e a desídia dos servidores públicos em geral e dos
governantes em particular no trato do dinheiro público e da coisa pública como
um todo. Espera-se contribuir para esse debate onde princípios, direito e
justiça estão envolvidos.
OS DIREITOS HUMANOS
FUNDAMENTAIS
Os direitos humanos fundamentais costumam
ser classificados pela doutrina clássica como direitos humanos subjetivos com
aplicação nas relações das pessoas com o Estado e com a sociedade, preceituados
ou não nas Constituições. Modernamente,
entretanto, se entende que a natureza jurídica dele é dúplice, ou seja, os
direitos fundamentais seriam os únicos direitos que ao mesmo tempo são direitos
subjetivos e objetivos.
De um lado, eles são categorias especiais
de direitos subjetivos porque ligados à condição de pessoa humana e, de outro
lado, são partes integrantes dos direitos objetivos, da ordem jurídica uma vez
que possuem a estrutura de princípios. De tão importantes que são os direitos
fundamentais, a teoria moderna desses direitos prescreve que os tratados
internacionais que versam sobre direitos humanos podem preponderar até sobre a
Constituição se eles forem mais benéficos à pessoa humana.
Os direitos fundamentais, desde o seu
surgimento ainda no século XIII, passando pelas Constituições dos séculos XVII
e XVIII até chegar aos dias atuais, atravessaram transformações significativas,
especialmente no século XX, com o fenômeno da modernidade. A doutrina entende
que são quatro as etapas dessas transformações: a primeira etapa teria sido a
sua constitucionalização nas Declarações de Direitos que integraram as primeiras
Constituições liberais e, posteriormente, nas Cartas liberais e democráticas
que se foram sucedendo nos diversos países. A segunda fase caracterizou-se pela
progressiva extensão dos direitos, passando pela liberdade, reconhecida, de
forma mais ampla, como direito de associação, e pela consideração de direitos
civis também como direitos políticos, chegando até o direito ao voto para
homens e mulheres. A terceira etapa, que alcança o período atual, é a da
universalização dos direitos, iniciada com a Declaração Universal dos Direitos
do Homem, representada pela transposição do Direito para fora dos limites
internos de cada país, proporcionando ao indivíduo a possibilidade de invocar
outras esferas superiores de justiça, inclusive contra o próprio Estado, o que
o transforma em sujeito do direito internacional. Uma quarta etapa, mais
recente, estende a proteção a direitos muito específicos, ligados a questões de
sexo, idade, saúde, deficiências físicas e mentais, entre outras.
Como foi dito acima, os direitos
fundamentais passaram por alterações na sua compreensão ao longo da história.
Daí decorrem as diferentes gerações, ou gestações dos direitos fundamentais.
Classicamente, são três as gerações dos direitos fundamentais e historicamente
a Revolução Francesa é a origem e o fundamento deles. Os direitos fundamentais
de 1º Geração seriam os direitos de liberdade e propriedade e são direitos
influenciados pelo valor da liberdade. Seriam os direitos individuais de ir,
vir e ficar: o direito à segurança, o direito à propriedade, patrimônio etc.
Os direitos fundamentais de 2º Geração
seriam os direitos influenciados pelo valor da igualdade. Seriam os direitos
sociais e visam à igualdade mesmo que utópica entre os trabalhadores, tais como
a igualdade quanto à previdência social, a cultura, a educação o desporto etc.
Os direitos fundamentais de 3º Geração
seriam os direitos influenciados pelo valor da fraternidade ou solidariedade.
Seriam os direitos difusos, tais como o direito ao meio ambiente equilibrado e
sadio, o direito à paz mundial, o direito às telecomunicações, o direito ao
patrimônio público etc.
Alguns autores sustentam a existência da
4a Geração de direitos fundamentais relacionados ao processo de globalização,
tendo como exemplo o amplo acesso à informação e o direito à democracia etc.
O conceito atual de Constituição como
ápice do ordenamento jurídico e preocupada com a proteção aos direitos humanos
só foi possível depois da consolidação do Estado Moderno, depois do surgimento
da noção de soberania estatal. Na maioria dos países europeus, o Estado
nacional só começa a se formar em meados do séc. XVI e final do séc. XV. Até
então, não havia um poder único, não existia a ideia do Estado como titular do
monopólio e do uso legítimo da força, centro único de produção de normas
jurídicas, mas, ao contrário, o poder era fragmentado e desconcentrado.
Com a unificação do Estado vem à tona um
movimento chamado de Iluminismo, e que foi um dos responsáveis pela unificação
dos Estados Nacionais. O Iluminismo foi uma filosofia racionalista, buscava
libertar o homem da tradição, do preconceito e alicerçar todo conhecimento
humano na razão. O Iluminismo era essencialmente uma filosofia antropocêntrica,
quer dizer, uma filosofia que centrava as suas preocupações na figura do homem,
diferentemente do pensamento até então em que o centro das preocupações a
religião.
Para proteger o homem e potencializar os
valores humanitários, que eram o objetivo do iluminismo, era preciso, antes de
tudo, limitar esse poder estatal que era um poder absoluto quando o Estado
nacional se formou. O chamado Estado Absolutista se confundia com a figura do
rei monarca que não conhecendo limites jurídicos, e sua atuação invariavelmente
atropelava os direitos humanos.
Esse foi o nascimento do constitucionalismo
que foi a expressão jurídica da preocupação com a proteção dos direitos humanos
fundamentais. Para isso, a ideia era de criar uma determinada estrutura para o
Estado, de tal sorte que ele não pudesse violar os direitos humanos. A
tripartição e a separação de poderes surge para dividir o exercício do poder e
com isso nenhum poder vai se sobressair, nenhum poder vai controlar os outros
poderes e assim os direitos do homem não serão violados.
Além disso, o Estado vai ser limitado
através da definição e positivação dos direitos fundamentais, que vão consistir
em barreiras protegendo a autonomia privada da intervenção indevida do poder
público. Esses direitos, nesse primeiro momento, vão consistir em deveres de
abstenção estatal, o Estado vai garanti-los, vai protegê-los se omitindo,
deixando de agir.
Então, o Estado mínimo foi quase que uma
consequência dessa visão dos direitos humanos. O Estado se restringia ao
desempenho de tarefas muito limitadas, ele protegia somente a propriedade, a
segurança interna e externa. Com o passar do tempo foi se tornando claro que
aquele modelo de Estado absenteísta, ausente, não bastava. O Constitucionalismo
Liberal ao proteger apenas a propriedade privada, ao criar o arcabouço
institucional necessário para o desenvolvimento apenas do comércio, da
indústria e da atividade econômica como um todo, permitiu que o capitalismo se
tornasse um capitalismo selvagem e desumano, com a injusta exploração econômica
do homem como se fosse mercadoria. Naquela época, mulheres e crianças
trabalhavam até 18 horas por dia com um salário miserável, sem nenhuma proteção
da sociedade e do Estado.
Então começaram a surgir críticas a esse
modelo de Constitucionalismo Liberal. Uma delas partiu do filósofo Karl Marx,
muito influente até hoje. Para ele, a história das liberdades, da Revolução
Francesa, do Estado de Direito, era só um artifício para esconder a dominação
de uma classe social sobre a outra, estando dentro da superestrutura que visa
dar um verniz de legitimidade a uma situação de exploração da burguesia sobre o
proletariado. Surgiram várias outras críticas não tão radicais, como por
exemplo, o Socialismo Utópico, a Doutrina Social da Igreja e outras mais.
Essas ideias ganharam um canal que pelo
qual elas puderam ser trazidas para dentro do universo jurídico e para dentro
do universo constitucional. Paralelo à consagração da ideia de igualdade,
paulatinamente foi se estendendo o direito de voto a parcelas cada vez maiores
da população e essas parcelas tinham agora como expressar as suas vontades
através de mecanismos juridicamente institucionalizados. Uma das conquistas do
iluminismo foi a recuperação do ideal democrático que tinha surgido na Grécia
antiga.
A ideia brotou ali, mas a extensão do
direito de voto e do poder político a parcelas cada vez maiores da humanidade
foi fruto de lutas seculares e sangrentas. O deslocamento do eixo do poder
político levou a que se incorporasse a noção de cidadania a parcelas cada vez
maiores que tiveram como expressar as suas demandas. Então, por isso e por uma
série de outras razões econômicas, a virada do século XIX para o século XX vai
assistir uma mudança no paradigma de Estado que se refletiu diretamente no
conceito de Constituição e de Constitucionalismo.
A Constituição até então era concebida
apenas como uma limitação ao poder estatal. O papel das Constituições era
estruturar o Estado e fortalecer o elenco de garantias individuais que
impedissem que o Estado violasse as liberdades do homem, um papel relativamente
reduzido. As Constituições eram apenas contenções ao poder estatal. Ora, com
essas novas necessidades, essas novas demandas da sociedade, o Estado teve que
crescer para atendê-las. Com esse crescimento o Estado abdicou do papel de mero
espectador dos conflitos distributivos que se travavam no seio da sociedade
civil e foi paulatinamente assumindo a função de regulador do mercado, de
protagonista, inclusive do processo econômico.
Por outro lado, os direitos que as
pessoas tinham em face do Estado foram também se alterando. Se até então os direitos
humanos eram um direito a abstenção do Estado, com esse novo paradigma vão
surgir outros direitos positivos, direitos cuja prestação vai consistir numa
atuação comissiva, ativa, do poder público, como por exemplo, o direito à
saúde, educação, previdência social, etc. São pretensões que demandam do poder
público um crescimento, que demandam atuações positivas que para serem
concretamente desempenhadas, necessitam de um Estado maior.
Foi essa a gênese do chamado Estado do
Bem Estar Social, o qual projetou consequências extremamente importantes na
compreensão do que é uma Constituição preocupada com a justiça. Se a
Constituição, até então, regulava apenas as relações jurídicas entre cidadão e
Estado, agora a Constituição passou a se ocupar com a sociedade. Então, o
Estado vai passar também a agir para proteger o homem do próprio homem e com
isso nós vamos ter o surgimento do direito social, do direito do trabalho a
constitucionalização dos direitos privados. A Constituição passa também a ser o
epicentro do ordenamento jurídico, o centro gravitacional em torno do qual
giram todos os demais ramos do direito.
O novo conceito que corresponde ao Estado
do bem estar social e a mudança no paradigma do Estado se refletiu na
modificação do conceito de Constituição. A Constituição não é mais aquela norma
que disciplina apenas as relações entre cidadão e Estado e que por isso tinha
que ser mínima. A Constituição do Estado do bem estar social é ambiciosa, ela
pretende ir além, estabelecendo metas e prescrevendo objetivos que as forças
políticas vão ter que cumprir. Nasceram principalmente através das
Constituições Mexicanas, Soviéticas e Alemã.
Por fim, após a segunda grande guerra
mundial, sobreveio a instituição de outra forma de Estado que é o Estado
Democrático de Direito, que no Brasil se materializou, ao menos formalmente, na
Constituição de 1988. O Estado Democrático de Direito é concebido com base em
dois fundamentos: respeito aos direitos fundamentais, aos direitos sociais e a
democracia.
O Estado Democrático de Direito é,
portanto, uma evolução em relação ao Estado Social, na medida em que o Direito
é visto com instrumento necessário à implantação das promessas de modernidades
não cumpridas pelo Estado Social. Desta forma, há um inevitável deslocamento do
centro de tensão e decisão dos Poderes Legislativos e Executivo para o Poder
Judiciário com a Jurisdição Constitucional.
O Estado Democrático de Direito e
Constituição Dirigente são conceitos e institutos intimamente ligados; são
instrumentos garantidores da conformação dos poderes constituídos com a
finalidade precípua de implementarem as promessas de uma igualdade material. O
Direito, portanto, assume relevante papel nessa empreitada, na medida em que é
o instrumento de conformação social, frente à inércia dos outros poderes. Por
outro lado, antiga separação de poderes de índole iluminista está em crise
porque as urnas não possuem hoje um papel único de fonte de legitimação
democrática do poder. Democracia e representação popular não são expressões
sinônimas, pois a primeira significa antes de tudo vontade popular.
O tema direitos humanos vai interessar
basicamente aos hipossuficientes, que são pessoas que precisam do Estado para
que possam concretizar direitos humanos relacionados à igualdade, pois estão à
margem da sociedade. Mas não a uma igualdade puramente formal, mas a igualdade
em um aspecto mais profundo, uma igualdade que é traduzida numa possibilidade
concreta de uma melhor qualidade de vida para as todas as pessoas com relação à
saúde, a moradia, educação, lazer e a cultura, principalmente para aqueles que
dependem do Estado para que possam concretizar essa igualdade.
O Brasil assinou a Declaração Universal
dos Direitos Humanos em 1948, um ato importante para a efetivação dos direitos
humanos em todo o mundo, bem como vários outros tratados internacionais a
respeito. Esses documentos foram ratificados pelo Brasil no ano de 1992, que
foi o ano também da ratificação do Pacto de São José da Costa Rica, que traz
também uma série de compromisso do país com os direitos sociais. Com isso, há
um comprometimento formal de nosso país com a comunidade internacional para
implementar estes direitos, mas objetivamente falta concretizá-los na realidade
social.
O fato é que até hoje em nosso país esses
direitos não foram implementados. A população, em sua grande maioria, continua
morrendo nos hospitais públicos devido ao atendimento médico deficiente e a
falta de saneamento básico, a cultura existe apenas para uma elite social e
mesmo o acesso à justiça é privilégio apenas de uma classe social, pois para
sua implementação são necessários informação e educação, direitos sociais que
também não são acessíveis a todos. Por outro lado, a Constituição de 1988 quis
um bem estar social para todos e não apenas para a elite, se qualificando como
uma Constituição compromissória, preocupada ainda que formalmente com todos os
seus cidadãos. Disso trata-se a seguir.
A FORÇA NORMATIVA DOS
PRINCÍPIOS
Com o
surgimento da Constituição de 1988, uma constituição eminentemente
principiológica, os princípios constitucionais passaram a ser aplicados a todo
o Direito. A visão moderna é no sentido de que o princípio tem força normativa
e, no momento de dizer o direito o intérprete deve somar preceito e princípio.
Os pilares básicos do Direito Constitucional que são a dignidade da pessoa
humana, a solidariedade social e a isonomia, vão permear todo o ordenamento
jurídico
Os juristas empregam o termo princípio em
três sentidos de alcance diferente. Num primeiro sentido seriam super normas,
ou seja, normas que exprimem valores e que por isso, são ponto de referência,
modelo para regras que as desdobram. No segundo, seriam standards, que se
imporiam para o estabelecimento de normas específicas, ou seja, as disposições
que preordenem o conteúdo da regra legal. No último, seriam generalizações,
obtidas por indução a partir das normas vigentes sobre determinada ou
determinadas matérias. Nos dois sentidos iniciais, tem o termo tem uma
conotação prescritiva; no último, a conotação é descritiva: trata-se de uma abstração
por indução.
Entretanto, em que pese o vocábulo
princípio ter como uma de suas características essa indeterminação conceitual e
dimensional, o certo é que, atualmente, os princípios jurídicos, sob qualquer
prisma que lhe seja atribuído o enfoque, ganharam, ou melhor, tiveram
reconhecido seu intenso grau de juridicidade. Ou seja, deixaram de desempenhar
os princípios um papel secundário, para passar a cumprir o papel de
protagonistas do ordenamento, ganhando, nessa medida, o reconhecimento de seu caráter
de norma jurídica potencializada e predominante. Tanto que a doutrina prescreve
que violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma. A
desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento
obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de
ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido,
porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores
fundamentais.
É inegável que os princípios possuem
positividade e vinculatividade, o que lhes confere a qualidade de normas que
obrigam e possuem eficácia positiva e negativa sobre comportamentos públicos ou
privados, bem como sobre a interpretação e a aplicação de outras normas, tais
como as regras, ou mesmo os princípios derivados de princípios mais abstratos.
Historicamente, a normatividade dos
princípios jurídicos perpassa por três distintos capítulos: o jusnaturalismo, o
juspositivismo e o pós-positivismo. O jusnaturalismo moderno inicia sua formação
a partir do século XVI. E tal escola tinha por objetivo deixar para traz o
dogmatismo medieval, bem como escapar do ambiente teológico em que se formou e
desenvolveu. Na fase jusnaturalista, os princípios ocupavam uma função
meramente informativa (para valorar como certo ou errado, conforme a norma de
direito positivo se conformasse ou não às diretrizes dos princípios), mas sem
qualquer eficácia sintática normativa. Nesta fase os princípios jurídicos eram
situados em esfera metafísica e abstrata, sendo reconhecidos como inspiradores
de um ideal de justiça, cuja eficácia se cinge a uma dimensão ético-valorativa
do Direito. Tamanha foi a influência histórica da escola jusnaturalista que, já
no século XIX, com o advento do Estado Liberal muitos dos preceitos seguidos
pelos jusnaturalistas foram incorporados em textos escritos. Era a superação
histórica do naturalismo.
Com a promulgação dos Códigos,
principalmente do Napoleônico, o Jusnaturalismo exauria a sua função no momento
mesmo em que celebrava seu triunfo. Transpondo o Direito racional para o
Código, não se via nem admitia outro direito senão este. O recurso a princípios
ou normas extrínsecos ao sistema do direito positivo foi considerado ilegítimo.
Surgia o positivismo. Nesta fase, tinha-se a pretensão de criar uma Ciência
Jurídica com objetividade científica e características similares das conferidas
às Ciências Exatas. Apartava-se, assim, o Direito da Moral, de modo a
inseri-los em compartimentos estanques para fins científicos.
O grande impacto do positivismo e o culto
velado a seus dogmas legitimou, ainda que sob vestes travestidas, a feitura de
autoritarismos dos mais diversos. Esses movimentos políticos e militares
ascenderam ao poder dentro do quadro de legalidade vigente e promoveram uma
barbárie em nome da lei. A queda do Positivismo coincide com uma época em que o
homem passou a se preocupar mais com os direitos sociais, atribuindo uma
dimensão superior à necessidade de se solucionar conflitos independentemente
das leis, viu-se que não é sempre que a lei é legítima, ou seja, que a norma
corresponde à vontade social.
Era o início do pós-positivismo jurídico.
A nova fase passou a atribuir maior importância não somente às leis, mas aos
princípios do direito. E os princípios, analisados como espécies de normas,
tinham, ao contrário das regras, ou leis, um campo maior de abrangência, pois
se tratavam de preceitos que deveriam intervir nas demais normas, inferiores,
para obter delas o real sentido e alcance. Tudo, se ressalte, para garantir os
direitos humanos. No pós-positivismo, os princípios jurídicos deixam de possuir
apenas a função integratória do direito, conquistando o status de normas
jurídicas vinculantes.
A superação histórica do Jusnaturalismo e
o fracasso político do Positivismo abriram caminho para um conjunto amplo e
ainda inacabado de reflexões acercado do Direito, sua função social e sua
interpretação. O Pós-Positivismo é a designação provisória e genérica de um
ideário difuso, no qual se incluem a definição das relações entre valores, princípios
e regras, aspectos da chamada Nova Hermenêutica Constitucional, e a teoria dos
direitos fundamentais, edificada sobre o fundamento da dignidade humana. A
valorização dos princípios, sua incorporação explícita ou implícita pelos
textos constitucionais e o reconhecimento pela ordem jurídica de sua
normatividade fazem parte desse ambiente de reaproximação entre Direito e
Ética.
Os princípios têm uma dimensão de peso de
tal forma que quando dois princípios incidirem sobre o caso concreto e apontam
em direções diferentes, o intérprete não é necessariamente forçado a escolher
por um princípio em detrimento do outro. Com princípios não há propriamente
antinomia. Existem tensões entre princípios que se equaciona através de uma
ponderação. O princípio não define de antemão, ao contrário da regra, quais são
as hipóteses em que ele vai incidir. A regra permite uma subsunção do fato à
norma, ao contrário do princípio. A característica dos princípios é que eles
são fluidos, têm um teor mais aberto, permitem arejar o direito, permitem que
ele se adapte às mudanças que ocorrem na sociedade, humanizam a aplicação do
direito e tornam mais relevante o papel do intérprete.
Os princípios estão associados a
direitos. Os princípios são instrumentos que permitem uma leitura moral da
Constituição. Moralidade da Constituição vem, sobretudo, em virtude dos
princípios. São exemplos de princípios em sentido amplo as diretrizes políticas
e os direitos previstos nas constituições.
Eles são um mandado provisório, isto é, a
resposta dada por eles não é necessariamente a resposta definitiva, eis que
você pode perquirir que outros princípios incidem, ponderar, aquilatar diante
das circunstâncias específicas que cercam o caso concreto qual a melhor
solução. As regras, ao contrário, são comandos definitivos. Assim, pensar em
princípio seria pensar em proporcionalidade, a resolução de conflitos
principiológicos se resolve através de uma ponderação que vai se pautar na
proporcionalidade.
Uma Constituição que contivesse apenas
regras não iria ter a maleabilidade suficiente para acomodar todas as infinitas
variações do fato social. Por outro lado, uma Constituição que contivesse
apenas princípios seria tão abstrata que geraria um clima de permanente
insegurança jurídica. Os princípios acabam permeando a interpretação da regra.
Todavia, o processo não é unilateral, no sentido de extrair as regras dos
princípios. É um processo de esclarecimento recíproco, no qual você interpreta
a regra à luz do princípio do qual ela decorre e por outro lado, o sentido do
princípio é informado pelo conteúdo das regras que constituem os seus
desdobramentos.
O importante é mostrar como é que a
aplicação de um princípio envolve uma margem de indeterminação, de
maleabilidade, muito maior. Só que não é subjetividade pura, não é arbítrio,
exige o emprego da racionalidade prática, é argumentação jurídica, é uma lógica
que não se confunde com a lógica matemática da subsunção. O que se deve
observar é que nem princípio é menos nem princípio é mais. Regra é muito
importante, já que o ordenamento jurídico precisa de segurança,
previsibilidade.
No Brasil, o marco zero desse novo
Direito que privilegia os princípios constitucionais sobre a regra posta, que
fez com que todo o ordenamento jurídico passasse a ser analisado à luz da
Constituição Federal, foi a Constituição de 1988. A carta passou a ser o centro
do sistema jurídico, ocupando o trono de onde, até então, reinava o Código
Civil. Em outros países, como a Alemanha, essa mudança começou a ser construída
antes, no pós-guerra.
No novo patamar da Constituição, o juiz
deixa de ser apenas “a boca que pronuncia a lei”, como um ser inanimado, e
passa a aplicar à legislação as garantias fundamentais das pessoas. Conceitos
como o jusnaturalismo (o homem tem direitos naturais que não dependem de leis
para serem respeitados) e o positivismo (o direito é somente aquilo que diz a
lei) quase saíram de circulação. Em seus lugares, surge o pós-positivismo, que
é o fenômeno jurídico que hoje presenciamos. Sem desprezar a lei, o juiz a interpreta
tendo como norte a Constituição, naqueles casos em que se entende que o direito
não cabe integralmente na norma legislada. Os grandes valores da humanidade
migram para o mundo jurídico pela porta dos princípios constitucionais
reaproximando a ética e o direito. Neste caso, o juiz é participante do
processo de construção do direito.
As teorias tradicionais não estão
derrotadas, mas não são suficientes para resolver os graves problemas sociais
presentes na realidade. Devido ao Constitucionalismo Democrático o Judiciário é
agora chamado a impor, não a sua vontade, mas a vontade da Constituição aos
agentes eleitos dos outros poderes da República para essas obrigações. A
Constituição, nesse modelo, desempenha o papel de assegurar as regras do jogo
democrático, propiciando participação política ampla e o governo da maioria e
proteger valores e direitos fundamentais Os princípios da Dignidade da Pessoa
Humana, do Mínimo Existencial Humano, da Máxima Efetividade da Constituição,
Força Normativa da Constituição, da Juridicidade e da Reserva do Possível são
princípios explícitos e implícitos em nossa Constituição.
Quanto ao princípio do mínimo
existencial, o principio corresponderia ao conjunto de situações materiais
indispensável a existência humana digna, considerada não apenas como
sobrevivência física mas também espiritual, intelectual e outros aspectos
humanos fundamentais de um estado de direito. É como se todas as pessoas
tivessem direito ao mínimo de direitos fundamentais necessários a uma vida
digna e o fundamento axiológico deste principio é a dignidade da pessoa humana.
A aplicação do principio da reserva do
possível na Administração Pública surge a partir da constatação que as
necessidades humanas são infinitas enquanto os recursos são limitados para essa
satisfação. O Estado não é o provedor universal de todas as necessidades
humanas. No caso, a ponderação judicial precisa considerar o que é
economicamente viável a ser prestado pelo Estado. O princípio é formado pelo
binômio razoabilidade da prestação somado a existência de disponibilidade
financeira do Estado para tornar efetivos as prestações positivas dele
emanadas. Importante asseverar que o principio não configura óbice ao
implemento das políticas sociais pelo Poder Judiciário, salvo se o Estado conseguir
comprovar a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível.
Quanto ao principio a vedação ao
retrocesso social, a vontade do Estado, ente permanente, e não apenas do
Governo, temporário por natureza, deve prevalecer. As políticas públicas são
direitos públicos subjetivos como, por exemplo, o programa do atual governo
federal conhecido por Bolsa- família de ajuda a milhões de famílias carentes, o
programa Farmácia Popular e outros programas sociais. Expressa a ideia de que
uma vez obtido um determinado grau de realização dos direitos sociais eles
passariam a constituir simultaneamente uma garantia constitucional e um direito
subjetivo que impediriam que novos governantes anulassem, ou revogassem
conquistas sociais. Como o destino do país não é previsível e como a
administração pública precisa de liberdade para conduzir o país, obviamente não
se trata de um principio absoluto.
Sobre o principio da máxima efetividade,
força normativa e juridicidade, esses princípios tem uma carga axiológica
comum, tendo em vista que defendem a eficácia direta e imediata de todos os
dispositivos presentes na Constituição, inclusive os que possuem conteúdo
programático. São formados por uma legalidade material com suas regras e
princípios em substituição a uma visão mais conservadora do direito alinhada a
legalidade em sentido formal. Não se pode mais ter uma leitura rígida da
separação de poderes. Mas deve haver uma preocupação com a Justiça.
O ESTADO
CONSTITUCIONAL
A sociedade atual, fruto das grandes
transformações políticas, econômicas e sociais dos séculos anteriores, surge
basicamente do triunfo histórico do Sistema Capitalista e da Revolução
Industrial, que modificaram as relações de produção industrial, a circulação de
mercadorias e o trabalho humano.
Com a globalização mundial, provocada
principalmente pelo desenvolvimento tecnológico da informática, das
telecomunicações e dos transportes, houve um incremento das trocas
internacionais. Os países foram gradativamente tendo menos fronteiras uns com
os outros, se integrando mais, numa grande interindependência o que tem
ampliado incomensuravelmente o âmbito das relações políticas, sociais e
econômicas inaugurando um grande mercado mundial, uma aldeia global.
Modernamente, o Estado aprimorou-se no
sentido de ser um Estado intervencionista e dirigente, em busca da melhoria das
condições sociais da comunidade. Não é o Estado Liberal, que está apenas
preocupado com a conduta individual, nem é o Estado Socialista, que suprime a
iniciativa particular, mas é o Estado que busca o bem-estar social, a eficácia
dos direitos humanos fundamentais e da dignidade da pessoa humana, centro do
nosso ordenamento jurídico.
Nossa Constituição inovou quando
determinou como seu fundamento a cidadania e a dignidade da pessoa humana.
Inovou quando declarou entre seus objetivos a solidariedade, a justiça e a
erradicação das desigualdades sociais e quando previu várias ações
constitucionais que possibilitam efetivação de seus preceitos programáticos e a
tutela dos direitos sociais. Ela uma Constituição compromissória com os
direitos fundamentais e com os direitos sociais, elegendo a dignidade humana
como grande principio norteador e prevendo os meios concretos de efetivação.
Nesse panorama, a Constituição Federal
deu grande relevo ao Poder Judiciário, responsável direto em apreciar as
violações a Constituição. É um dos três Poderes da Republica e tem a
responsabilidade direta pela guarda da Constituição. Mais que isso, quando o
artigo 5º, XXXV da Constituição Federal prescreve que “nenhuma lei pode excluir
da apreciação do Poder Judiciário a lesão ou ameaça de direito”, o texto
constitucional comprometeu os juízes em efetivarem a Constituição. Como
consequência, comprometeu os juízes na implementação das políticas públicas,
principalmente quando as políticas públicas não forem realizadas por quem
deveria realizá-la ou quando há má prestação dos serviços públicos.
As políticas públicas são os atos, leis,
diretrizes, programas que o Estado deve implementar para poder concretizar os
direitos sociais que são garantidos na Constituição. Os direitos sociais
precisam das políticas públicas para se efetivarem. São exemplos de Políticas
Públicas a construção de hospitais, escolas, a compra de medicamentos, a
contratação de médicos, a compra de merenda e livros escolares, a construção de
um museu, a política estatal de incentivo ao mercado de trabalho. São ações
concretas que visam efetivamente dar maior qualidade de vida principalmente aos
hipossuficientes.
A fiscalização e a implementação pelos
juízes das ações do Governo atualmente é um assunto que desperta grande
polêmica no país em geral e no meio jurídico em particular. Fala-se muito num
indesejável e temido governo dos juízes, um ativismo judicial tão comentado
devido a uma série de recentes e importantes decisões judiciais onde os juízes
adotaram decisões ousadas.
Porém, fica claro que, apesar de
existirem, Poderes da República responsáveis diretamente pelas políticas
públicas, como o Poder Executivo e o Legislativo, conforme previsão
constitucional, o Poder Judiciário também está comprometido com a efetivação
das ações do governo. Há legitimidade dos juízes para intervir nas políticas
públicas pois a separação dos Poderes da República, com a correspondente
separação de funções, previsto em nossa Constituição não tira a legitimidade do
Poder Judiciário para atuar na implantação das políticas públicas.
Uma Constituição de um país pode ser
definida como o sistema de normas, regras e princípios jurídicos escritos ou
consuetudinárias que regulam a forma de Estado, a forma de Governo, o modo de
aquisição e exercício do poder, o estabelecimento dos seus órgãos, os limites
de sua ação, os direitos e garantias fundamentais e a ordem econômica e social.
O objetivo maior do Direito Constitucional é o que se chama de “filtragem
constitucional”. Isso quer dizer que todas as espécies normativas do
ordenamento jurídico devem existir, ser consideradas como válidas e analisadas
sempre sob a luz da Constituição Federal. Através dessa observância é que se
afere se elas são ou não constitucionais. É nesse momento que entra o controle
de constitucionalidade responsabilidade do Poder Judiciário, para observar se
as leis e normas estão compatíveis com a Carta Magna.
O controle de constitucionalidade é um
dos temas mais sensíveis de teoria da Constituição, pois envolve em
profundidade a questão democrática. O controle de constitucionalidade dá a quem
não é eleito, no caso os juízes, o poder de afastar as decisões tomadas pela
maioria, pelos representantes do povo. A ideia é colocar certas decisões
fundamentais ao abrigo mesmo das paixões das maiorias. Aqui percebemos que o
Poder Judiciário é chamado a uma importante missão em nossa República.
A única justificativa democrática do
controle de constitucionalidade é a proteção das minorias. Democracia não é o
governo das maiorias, é o governo das maiorias que respeitam os direitos das
minorias. Sem controle de constitucionalidade, as maiorias podem prejudicar as
minorias. Por isto, este tema, como qualquer instituto do direito
constitucional, só pode ser bem compreendido à luz dos direitos fundamentais
que é o núcleo de qualquer ordem constitucional, pois a Constituição nasce da
necessidade de proteger o homem.
Inicialmente, quanto à aplicabilidade, a
Doutrina classifica as normas constitucionais em auto-executórias e não
auto-executórias. As normas auto-executórias são aquelas que estão aptas a
produzir todos os efeitos esperados pelo constituinte enquanto as normas não
auto-executórias são aquelas que precisam de algum tipo de regulamentação para
a produção dos efeitos desejados pelo constituinte.
Uma outra classificação divide as normas
constitucionais em normas de eficácia plena, normas de eficácia contida e
normas de eficácia limitada. As normas de eficácia plena são aquelas que não
precisam de regulamentação para produzir os efeitos desejados pelo
constituinte. As normas de eficácia contida são aquelas que o constituinte
permite ao legislador ordinário diminuir o alcance do que está previsto na
Constituição.
As normas de eficácia limitada são
aquelas que necessitam de regulamentação para a produção de seus efeitos. Elas
se dividem em normas definidoras de princípios institutivos e normas de
conteúdo programático. As normas definidoras de princípios institutivos são
aquelas que vão criar órgãos e entidades previstas na Constituição. As normas
de conteúdo programático por sua vez são aquelas que fixam metas e programas
que devem ser alcançados pelo Estado. E são essas que diretamente nos
interessam, pois elas prescrevem os direitos sociais.
Para a doutrina tradicional, os
destinatários dessas normas não podem exigir do Estado a sua imediata
aplicação. Para ela, as normas de conteúdo programático apenas vinculam
negativamente o Estado, que, no desempenho de suas diversas funções, não poderá
contrariar tais normas. O Estado só poderá criar leis compatíveis com as normas
programáticas. No desempenho da função administrativa, o Estado deverá, porém,
priorizar a materialização das normas programáticas, mas elas não teriam
eficácia plena e imediata.
A nossa Constituição de 1988 inovou
bastante quanto aos direitos humanos. Nas constituições anteriores não havia
títulos constitucionais sobre direitos e garantias fundamentais e que pudessem
hospedar como faz a Constituição de 1988, os direitos individuais, coletivos,
sociais, relativos à nacionalidade e partidos políticos e políticos. Antes da
Carta de 1988, a expressão direitos e garantias fundamentais era utilizada,
pelas Constituições passadas, como sinônimo de direitos individuais. Então,
direitos individuais, direitos fundamentais, liberdades públicas, direitos
humanos, etc., eram expressões sinônimas porque indicavam o mesmo instituto, o
mesmo fenômeno jurídico. A Constituição de 1988 desde logo instituiu o título
II, no qual o legislador constituinte originário hospedou os direitos
individuais e coletivos, sociais, da nacionalidade, políticos e de existência,
organização e participação dos partidos políticos.
O INSTITUTO DA
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
Em toda história humana, o ser humano
sempre cuidou do que é seu, até com o objetivo de garantir a sua sobrevivência
e a de seu grupo e apenas a essa forma de cuidar foi se alterando de acordo com
a época histórica. O próprio surgimento do Direito surge dessa preocupação com
as ações humanas que eventualmente feriam direitos de outrem sem que a haja a
necessidade de buscar a justiça pelas próprias mãos. Essa evolução culminou com
a possibilidade de responsabilizar civilmente o agente causador do dano aonde a
sociedade vai buscar um direito mais justo e eficiente.
Atualmente existe uma tendência do
instituto Responsabilidade Civil quase se tornar o centro das atividades
jurídicas. A reparação dos danos que a atividade dos homens causa aos outros
homens para muitos vai constituir o problema central do Direito contemporâneo.
A Responsabilidade Civil vai ocupar na sociedade contemporânea um lugar de suma
importância como consequência do grande desenvolvimento da sociedade.
Responsabilidade, no sentido jurídico,
quer dizer o dever que alguém tem de reparar o prejuízo decorrente da violação
de um outro dever jurídico ou um dever jurídico sucessivo que surge para
recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário. O
termo, em sentido amplo, encerra a noção de que se atribui a um sujeito o dever
de assumir as consequências de seus atos.
A atual forma da Responsabilidade Civil é
o produto de uma acentuada evolução através dos tempos. Nos primórdios o
ofendido reagia ao dano de maneira imediata e brutal, movido por puro instinto.
Nesta época predominava o sistema da vingança privada, foi a época da reparação
do mal pelo mal. Em tal fase a culpa sequer era cogitada, bastava o dano, fato
que possibilita classificar aquela responsabilidade de objetiva ou não
subjetiva. A necessidade de regulamentação desse castigo posteriormente deu
origem à pena do “olho por olho, dente por dente”, prevista na Lei de Talião.
Após
esse período, surge o período da composição voluntária, no qual o ofendido
passou a ter a faculdade de substituir a retaliação ao corpo do agente por uma
compensação de ordem econômica. Passa o lesado a perceber as vantagens advindas
desta mudança de conduta junto ao causador do dano. É o dinheiro substituindo o
castigo físico. Nessa fase a culpa ainda não é cogitada como elemento
necessário à indenização, ou seja, a responsabilidade também é objetiva, já que
dispensa a análise da culpa.
Eis que com o surgimento da estrutura do
Estado primitivo, mais precisamente com o surgimento de uma autoridade
soberana, ocorre a proibição à vítima de fazer justiça com as próprias mãos.
Com isso o Estado substitui o lesado na tarefa de dosar a pena ao agente
causador do ato danoso e, então, a composição deixa de ser voluntária para ser
obrigatória. Há a tarifação dos danos, sendo estipulado um determinado preço
para cada tipo de lesão. Nessa época, na qual foram elaborados os Códigos de Ur
Manu e da Lei das XII Tábuas, a responsabilidade também era objetiva,
prescindindo da verificação da existência da culpa.
Com a Lei Aquília romana desponta
um princípio geral da reparação do dano, sendo desta época as primeiras ideias
acerca da noção de culpa. É a responsabilidade ganhando traços subjetivos, com
a necessidade da averiguação da culpa do agente para a caracterização da
obrigação de ressarcir. Nessa fase, além do distanciamento da responsabilidade
objetiva, houve a cristalização da reparação pecuniária.
Na Idade Média o pensamento dos romanos
foi sendo aperfeiçoado. Evoluiu-se da enumeração dos casos de composição
obrigatória para um princípio geral, culminando, passo a passo, na consagração
do princípio aquiliano, segundo o qual a culpa, ainda que levíssima, obriga a
indenizar. Após a Revolução Francesa (1789), já na Idade Contemporânea, surge o
Código de Napoleão, com a previsão da responsabilidade contratual, bem como é
feita a distinção entre a responsabilidade penal e a civil.
O Direito francês influenciou vários
povos e, por consequência, a legislação de vários países, inclusive do Brasil.
Assim, ainda que por via reflexa, o atual Código Civil e especialmente o
revogado Código Civil de 1916, cuja vigência se estendeu até 2002, tiveram
aquele Códex como fonte inspiradora, o que levou a consagração da teoria
da culpa como regra no campo da responsabilidade civil.
A previsão legal o instituto da
Responsabilidade Civil se encontra originariamente no art. 5º, V de nossa
Constituição Federal que prescreve que “é assegurado o direito de resposta,
proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à
imagem”. Bem como no art. 5º, X de nossa Constituição Federal que relata que
“são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de
sua violação”.
Também há previsão expressa no atual
Código Civil quando prevê no art. 186 que “aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem,
ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Segue no art. 187 que
“também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede
manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela
boa-fé ou pelos bons costumes”. Prescreve por sua vez o art. 189. “violado o
direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição”.
Já o Título IV do Código Civil que abriga o instituto da Responsabilidade
declara no art. 927 que “aquele que por ato ilícito causar dano a outrem, fica
obrigado a repará-lo”.
O instituto da Responsabilidade Civil é
parte integrante do Direito Civil, se inserindo em especial no Direito das
Obrigações e obedecendo a seus princípios específicos. A principal consequência
da prática de um ato ilícito, principal fonte da responsabilidade civil, é a
obrigação que acarreta para seu autor de reparar o dano, obrigação esta de
natureza pessoal, que se resolve em perdas e danos.
Responsabilidade Civil, em termos gerais,
é a obrigação de reparar o dano que nasce da prática de um ato ilícito ou da
lei. Ora, o ilícito civil é diferente do ilícito penal. O Ilícito Penal está
sujeito ao Princípio da Tipicidade, só é ilícito penal o que é típico, o que a
lei tipifica, o que a lei define. No Direito Civil não é assim. O art. 186, CC
vai prescrever que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral, comete ato ilícito”.
A diferença entre os dois ilícitos está
na natureza, no tipo de sanção. Descumprida a Lei Penal, surge o ilícito penal,
e aparece uma sanção que atinge, principalmente, a liberdade. Quem descumpre a
Lei Civil, responde civilmente, só que não com a liberdade, responde com o
patrimônio, a sanção civil é de natureza patrimonial. A pessoa que pratica um
ato ilícito responde com seus bens que tem expressão econômica, porque esta
pessoa que praticou o ato ilícito está causando um dano, então, ela vai pagar
com bens de seu patrimônio para reparar o dano que ela causou.
Os elementos
do ato ilícito civil vão ser extraídos do conceito que a lei fornece no acima
citado art. 186, CC. Fazendo nova remissão: “Aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem,
ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
O primeiro elemento é a ação. Para que se
possa falar em ato ilícito civil é necessário que haja uma ação, ou seja, é
necessário que haja uma conduta, que inclui ação em sentido estrito, e inclui a
omissão. O ato civil pode ser causado por uma ação ou por uma omissão.
O segundo elemento do ato ilícito é o
dano, que é a lesão a um bem jurídico. Toda vez que um bem jurídico é atingido,
é lesionado, ocorre o dano. O Código Civil diz, repetindo o que consta na
própria Constituição, que é possível a reparação tanto do dano material quanto
moral, pois “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem
das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação”. Isto está na Constituição, no artigo 5º, inciso X.
A diferença entre dano material e dano
moral é que existem dois tipos de bens jurídicos, por isto vão existir dois
tipos de danos. Existem bens jurídicos que tem expressão econômica, ou seja,
podem ser valorados em dinheiro, são os bens jurídicos, que compõem o nosso
patrimônio. E a lesão ao bem jurídico que tem expressão econômica é o que
chamamos de dano material ou dano patrimonial.
Agora, existem bens jurídicos que não tem
expressão econômica. São os chamados direitos da personalidade. Eles são
intransmissíveis, inalienáveis, não tendo expressão econômica, eles são
inestimáveis. Eles pré-existem a nós, antes mesmo de nascermos eles já
existiam, eles são pré-existentes.
Esses direitos da personalidade são, por
exemplo, o direito à vida, a integridade física, à imagem, à honra, à liberdade
em todos os seus planos (liberdade de expressão, de circulação), enfim, estes
direitos da personalidade estão ligados a um princípio constitucional previsto
no art. 1º, III, CF, o princípio da dignidade da pessoa humana. Quando um direito da personalidade é
atingido, direito esse sem expressão econômica, então o dano é chamado de dano
moral ou dano extra patrimonial ou dano imaterial.
O dano moral não deve ser entendido como
um simples aborrecimento, dor e sofrimento pois estes são apenas consequências
do dano moral. O dano moral só vai ocorrer quando uma pessoa for atingida na
sua dignidade humana.
Atualmente, fala-se muito na indústria do
dano moral, pois o pedido judicial para indenização por dano moral está
banalizado. São muitos os processos nos tribunais pedindo indenização por
simples aborrecimentos comuns. O dano moral vai acontecer basicamente quando a
dignidade for atingida, o direito da personalidade atingido, senão pode virar
um enriquecimento sem causa. Por isso, segundo a doutrina, em regra, descumprir
o contrato não enseja dano moral, porque para haver dano moral tem que ser
atingida a dignidade da pessoa.
O valor da reparação do dano material vai
se dar pelo cálculo das chamadas perdas e danos. As perdas configuram aquilo
que a doutrina chama de dano emergente. Dano emergente é aquilo que a vítima do
dano efetivamente perdeu e tem direito à efetiva reparação. Lucro cessante é
aquilo que a vítima do dano razoavelmente deixou de ganhar.
O terceiro elemento do ato ilícito é a
culpa. No Direito Civil, a culpa se configura no agir com vontade de causar um
dano ou assumir um risco de causar um dano ou deixar de observar o dever de
cuidado. O quarto, último e o mais importante elemento do ato ilícito é o nexo
de causalidade, ou nexo causal. É o liame que une a ação ao resultado desta
ação, que é o dano. O dano é o resultado da ação.
Excludentes de nexo de causal são aqueles
comportamentos que estão ao redor da ação preponderante que gera o dano e que
vão excluir o ato ilícito, e com isso o dever de indenizar. A primeira excludente
do nexo de causalidade é o chamado fato exclusivo da vítima. Ocorre quando o
dano sofrido pela vítima foi causado pela ação da própria vítima. No ato
exclusivo da vítima existe a ação ou omissão enquanto no fato exclusivo da
vítima no lugar da palavra fato está a palavra culpa.
O fato concorrente da vítima, por sua
vez, vai servir como atenuante da Responsabilidade Civil. A vítima em parte
causa o dano e vai ficar atenuada a responsabilidade civil do agente causador.
O segundo excludente de nexo causal é o
fato exclusivo de terceiro. O dano é causado não por aquela pessoa que a vítima
acusa, mas por um terceiro. O terceiro gera o dano da vítima então não haverá
nexo de causalidade, logo não haverá Responsabilidade Civil.
A terceira excludente do nexo é a chamada
cláusula de não indenizar. Essa cláusula na realidade não exclui nexo, o nexo
esta presente, ou seja, uma pessoa com a sua ação vai causar o dano de outrem.
Só que essa pessoa que pratica a ação não vai responder pelo dano porque houve
um acordo, foi ajustado que ela não responderia. A cláusula de não indenizar
exige que haja um contrato entre as partes no qual fica estipulado que ainda
que uma ação da parte cause dano à outra, não haverá dever de indenizar.
Para ser
válida e gerar efeitos é necessária a presença de bilateralidade onde as duas
partes devem querer a cláusula. É por isso que, nos contratos de adesão, as
cláusulas de não indenizar não são válidas, são nulas, não geram efeitos. O
segundo requisito é que não seja vedada por uma lei cogente, por isso que é
vedada a cláusula de não indenizar na relação de consumo. Prescreve o CDC no
art. 25 que “é vedada a estipulação contratual de cláusula que impossibilite,
exonere ou atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas seções anteriores”.
Quarta e última excludente do nexo é o
caso fortuito e a força maior. Prescreve o art. 393, CC que “o devedor não
responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se
expressamente não se houver por eles responsabilizado”. O seu parágrafo único
relata que “o caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário,
cujos efeitos não era possível evitar ou impedir”. O caso fortuito e
força-maior são noções distintas dos requisitos necessários para a "teoria
da imprevisão" com fundamentos e efeitos diversos. O caso fortuito ou de
força-maior só libera a responsabilidade civil quando acarreta a
impossibilidade absoluta da execução enquanto que, em matéria de imprevisão, se
atende a onerosidade excessiva da prestação.
A Responsabilidade Civil nasce da prática
de um ato ilícito, e será classificada pela doutrina em contratual ou negocial
e extracontratual ou aquiliana. A diferença é que na Responsabilidade
contratual a prática do ato ilícito é dentro do contrato enquanto a Responsabilidade
extracontratual é a prática de ato ilícito fora de contrato.
A Responsabilidade Civil pode ser
subjetiva ou objetiva. A Responsabilidade Civil subjetiva faz uso de todos os
elementos do ato ilícito que são a ação, o dano, o nexo causal e a culpa. Por
essa teoria uma pessoa só vai responder civilmente quando a ação dela causou um
dano e ela agiu com culpa. O ônus da prova dos quatro elementos que criam a
Responsabilidade Civil subjetiva vai pertencer à vítima do dano.
A Responsabilidade Civil Objetiva, por
sua vez, vai ter seu fundamento no risco inerente a algumas ações, isto é, na
teoria é na Teoria do Risco. Existem ações perigosas, arriscadas que causam
dano com uma grande probabilidade e a culpa vai ser um elemento presumido de
modo absoluto. A previsão legal se encontra no art. 927 CC que prescreve que
“haverá obrigação de reparar o dano independentemente de culpa nos casos
especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor
do dano, implicar por sua natureza risco para os direitos de outrem”.
Na Responsabilidade Civil objetiva, não
se exige da vítima prova de culpa do agente, para que seja o mesmo obrigado a
reparar o dano. Exige-se, isto sim, apenas a prova da efetiva ocorrência do
dano contra si perpetrado e do nexo causal entre a conduta do agente e o dano.
É pertinente salientar que, dentro da responsabilidade objetiva, a prova de
culpa é inexigível, seja porque ela é presumida, seja porque, de todo
dispensável ou prescindível.
Existe, ainda, a responsabilidade por
omissão. Neste caso, o Estado só responderá se houver omitido dever que lhe
tenha sido prescrito pelas normas; não se a inação for lícita. A inação tem
obrigatoriamente, que apresentar o caráter ilícito para que se configure a omissão.
O PAPEL CONSTITUCIONAL
DO PODER JUDICIÁRIO.
Verdadeiramente o poder político no
Estado, apesar de ser tripartido, é uno e indivisível. Há apenas um poder
político, que é o poder do Estado, que é o poder revelado na ordem jurídica com
força de constranger à obediência, de coordenar e impor uma decisão. Mas esse
poder político do Estado tem três funções básicas: a legislativa, a executiva e
a jurisdicional. O poder Legislativo se encarrega de gerar a lei, o Executivo,
da atividade administrativa e o Poder Judiciário, da jurisdição, dissolvendo
conflitos. A rigor não existe, portanto, divisão de poderes, mas de funções que
para ser exercitadas há necessidade de criação de poderes através de órgãos,
mas o Poder é um só: uno, indivisível, imprescritível, etc. E essas funções são,
em regra indelegáveis, na ideia da existência da repartição constitucional de
competências.
O Poder Judiciário é órgão fundamental na
formação de um Estado Democrático de Direito, pois cabe a ele, com autonomia e
independência, velar pela guarda da Constituição, especialmente pela
observância dos princípios da igualdade e da legalidade. De fato, seria
inimaginável um Estado Democrático de Direito sem um Poder Judiciário
independente, com a relevante função de administrar a Justiça, como fiscal da
aplicação da Constituição e das Leis. Por outro lado, o Poder Judiciário é
apontado por parte da doutrina como verdadeiro direito fundamental dos
cidadãos, pois a estes é assegurado o direito de ser julgado por Juízos e
Tribunais independentes e imparciais. A espinha dorsal do sistema judicial
brasileiro muito dela é cláusula pétrea e baseada no princípio da unidade da
jurisdição, inafastabilidade do controle jurisdicional, garantias da
magistratura e independência do Judiciário.
Antigamente, com o Estado Liberal, o Poder
Judiciário não tinha muitos poderes, nem muitas atribuições sendo apenas um
órgão subsidiário do Estado e praticamente não interferia na sociedade. Com a
Constituição de 1988 o Poder Judiciário ficou fortalecido. A partir desse
momento, esse Poder passou a ficar em pé de igualdade com os demais poderes e,
consequentemente, passou a controlar todos os assuntos da sociedade e por isso
passou a ser mais procurado.
A atual Constituição incrementou o
Judiciário, reforçou suas garantias, dotou tal poder de uma série de
instrumentos e mecanismos que visam possibilitar uma prestação jurisdicional
independente, imparcial e insubmissa à vontade dos donos do poder. Não há
paralelo em outras Constituições, já que o nosso sistema é o que mais reforça a
magistratura. As garantias funcionais e as garantias institucionais dos
magistrados são amplas: inamovibilidade, vitaliciedade e irredutibilidade de
subsídios, o autogoverno etc. Esse último permite que o Judiciário escolha seus
dirigentes, e é por isso que o presidente do Supremo Tribunal Federal é
escolhido por ele mesmo e os chefes dos órgãos dirigentes dos tribunais são
escolhidos por cada tribunal.
Os órgãos que integram o nosso Poder
Judiciário foram enumerados pela Constituição Federal, no seu art. 92: o
Supremo Tribunal Federal; o Conselho Nacional de Justiça; o Superior Tribunal
de Justiça; os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais; os Tribunais e
Juízes do Trabalho; os Tribunais e Juízes Eleitorais; os Tribunais e Juízes
Militares; os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e
Territórios. Veremos alguns deles com mais detalhes.
O Supremo Tribunal Federal compõe-se de
onze membros, nomeados pelo Presidente da República, após aprovação pela
maioria absoluta do Senado Federal, dentre cidadãos de notório saber jurídico e
reputação ilibada, com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos
de idade. A competência do Supremo precípua é a da guarda da Constituição, logo
é um órgão que tem como finalidade principal a tutela da Constituição. Além
dessa função, ele agrega outras, ele é, por exemplo, árbitro dos conflitos
federativos, em uma ação de um Estado contra outro ou de um Estado contra a
União. Ele exerce também a função de tutelar os direitos fundamentais através,
sobretudo, da competência para apreciação de remédios constitucionais, como o
Habeas Corpus, Mandato de Segurança, Habeas Data, mesmo que a questão,
eventualmente, não envolva matéria constitucional.
O Supremo Tribunal Federal é nosso órgão
de cúpula de toda a Justiça. O Supremo Tribunal Federal atua no âmbito do
controle difuso ou incidental, quando aprecia, em última instância, as
controvérsias concretas suscitadas nos Juízos inferiores, e também realiza,
originariamente, o controle concentrado ou abstrato, quando aprecia a
constitucionalidade, em tese, de leis e atos normativos federais e estaduais em
face da Constituição Federal.
Enquanto o STF é guardião da Constituição
Federal o STJ é considerado o guardião do direito, sendo sua competência
dividida em originária, quando o STJ é acionado diretamente, nas ações em que
cabe a ele julgamento originário, e recursal, quando o STJ aprecia recursos
ordinários ou especiais. As competências do STJ estão enumeradas no art. 105 da
Constituição Federal.
Os demais Tribunais Superiores integram a
chamada Justiça Especializada, pois só atuam num dado ramo do Direito,
especificamente. Assim, o Tribunal Superior Eleitoral só aprecia matéria
eleitoral; o Tribunal Superior do Trabalho, só matéria trabalhista; o Superior
Tribunal Militar, os crimes militares. Jurisdicionados pelos Tribunais
Superiores, temos os órgãos de segunda instância da Justiça, organizados
regionalmente, nas diferentes unidades da Federação. Temos, nesse grau, os
Tribunais de Justiça (2ª instância da Justiça Estadual); os Tribunais Regionais
Federais (2ª instância da Justiça Federal); os Tribunais Regionais do Trabalho
(2ª instância da Justiça Especializada do Trabalho); os Tribunais Regionais
Eleitorais (2ª instância da Justiça Eleitoral); os Tribunais Militares (se instituídos
em lei, nos termos do art. 122, II, da Constituição Federal). Finalmente, temos
os órgãos locais da Justiça, distribuídos pelos Municípios da nossa Federação:
Juiz de Direito (justiça estadual); Juiz Federal (justiça federal); Juiz do
Trabalho (justiça trabalhista); Juiz Eleitoral (justiça eleitoral).
A Constituição Federal outorgou
importantes garantias ao Poder Judiciário, como meio de assegurar-lhe autonomia
e independência para o imparcial exercício da jurisdição. Essas garantias,
portanto, não são privilégios dos magistrados, mas sim prerrogativas que
asseguram, ao Poder Judiciário, independência no exercício de suas relevantes
funções constitucionais, sem a ingerência dos Poderes Legislativo e Executivo.
Para se ter uma ideia da relevância dada pelo legislador constituinte ao tema
garantias do Poder Judiciário, basta lembrarmos que constituem crime de
responsabilidade do Presidente da República os atos que atentem contra o livre
exercício do Poder Judiciário e que referido assunto não pode sequer ser objeto
de medida provisória tampouco de
delegação legislativa.
A Constituição Federal outorga ao Poder
Judiciário autonomia administrativa e financeira (CF, art. 99), dispondo que os
tribunais elaborarão suas próprias propostas orçamentárias, desde que dentro
dos limites estipulados conjuntamente com os demais Poderes na lei de
diretrizes orçamentárias. Prescreve também a possibilidade da escolha dos
dirigentes dos tribunais e as garantias aos seus membros com a vitaliciedade,
inamovibilidade e irredutibilidade de subsídio.
Pelo visto acima, o Poder Judiciário tem
base para atuar na efetivação dos direitos sociais pois, além de contar com a
legitimidade Constitucional direta, como visto acima, há a legitimidade
indireta, pois a seleção dos juízes é por concurso público, um mecanismo
eminentemente democrático. Não se pode esquecer que os juízes dos tribunais
superiores são escolhidos pelo Poder Executivo e referendados pelo Senado
Federal, fora diversos mecanismo de participação da sociedade no poder judiciário
como a figura do amicus curiae, na composição popular do CNJ, o quinto
constitucional composto por advogados e a participação popular nas súmulas
vinculantes. Outro eficiente meio de controle da atividade do Poder Judiciário
é na obrigatoriedade da fundamentação de suas decisões o que permite um
controle por outros juízes, por outras instâncias e pela própria sociedade
garantindo uma decisão justa e democrática.
Os direitos fundamentais são aqueles
considerados indispensáveis para uma vida digna em sociedade. Eles são tratados
no texto constitucional como forma de garantia de uma maior proteção em razão
da rigidez constitucional, ou então, para que sejam preservados através da
cláusula de imutabilidade. São as chamadas cláusulas pétreas, previstas no art.
60 § 4º da Constituição atual, que prescrevem que não será objeto de
deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma federativa de
Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes;
os direitos e garantias individuais.
O Princípio da Efetividade dos Diretos
Fundamentais ou da Aplicabilidade Imediata dos Direitos Fundamentais está
consagrado no art. 5º, § 1º da Carta Magna, que prescreve que “as normas
definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”. Essa
aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais deve ser entendida como uma
diretriz exegética para o intérprete buscar extrair da norma a maior carga de
efeitos que ela pode dar. Então, o intérprete diante de uma norma constitucional
especial que consagra direito fundamental deve pensar no que ele pode fazer
para tirar daquela norma o máximo de efeitos possíveis.
O grande problema da aplicabilidade
imediata dos direitos fundamentais diz respeito aos direitos humanos de
conteúdo prestacional. Com relação aos direitos individuais de defesa, tem se
entendido que a aplicabilidade imediata vale incondicionalmente, como é o caso
do Mandado de Injunção. Quanto aos direitos sociais o foco da questão é que são
direitos que dependem de prestações, dependem também de recursos. O problema é
que os recursos são limitados e a visão clássica é de que, no quadro de
escassez, as escolhas ou prioridades devem ser feitas não pelo Poder Judiciário
em suas sentenças, mas por poderes que têm legitimidade conseguida da vontade
popular direta, através das eleições, como o Poder Legislativo e o Poder
Executivo. Até por que, constitucionalmente o Legislativo faz o orçamento e o
Executivo executa o orçamento.
Com isso, a concepção tradicional, negava
eficácia imediata aos direitos fundamentais prestacionais, afirmando que os
direitos individuais eram exigíveis e que os direitos prestacionais não eram,
dependeriam de legislação. Essa é a visão que durante muito tempo prevaleceu e
que está ligada com uma certa equiparação dos direitos sociais às normas
programáticas, e a leitura de normas programáticas como normas que possibilitam
que se oponha a uma conduta do Estado, mas não que se exija uma prestação a
partir dela.
No entanto surgiram outras compreensões
em relação à questão. Uma tese existente afirma que mesmo nos direitos
prestacionais, que estão consagrados de forma mais abstrata, como saúde,
moradia, em que o texto constitucional não define a prestação, existe um mínimo
de direitos que deve ser tutelado, um mínimo existencial, e que somente o que
ultrapassar esse mínimo vai depender de lei, vai depender de ato da
administração com previsão no orçamento, ou seja, vai ficar ao sabor das
autoridades políticas, mas o mínimo está garantido.
A ideia da existência do mínimo
existencial neutraliza algumas das alegações feitas contra a eficácia dos
direitos prestacionais. Por exemplo, uma das alegações que se faz é que essa
concepção de dar ao Poder Judiciário a tutela dos direitos prestacionais gera
uma concepção antidemocrática de Governo de Juízes, de forma que o Poder
Judiciário vai começar a interferir nas escolhas das prioridades dos gastos,
das políticas públicas, o que não é democrático nem republicano.
Só que a concepção contemporânea de
democracia afirma que a democracia pressupõe o mínimo e que governo democrático
não é só o governo em que ocorram eleições periódicas. Vão existir pressupostos
para essa democracia, e, dentre estes pressupostos, estaria a existência do
mínimo existencial para que se possa participar conscientemente do debate
democrático. Assim, se o mínimo é pressuposto da democracia, assegurá-lo não
pode ser contrário à democracia, o que neutraliza a crítica democrática. Esse
argumento neutraliza de certa maneira também a crítica liberal uma vez que a
liberdade só pode ser assegurada quando há o mínimo de condições materiais para
isso.
Por outro lado, a efetividade dos
direitos na Constituição é máxima por natureza e assim não haveria motivo para
se falar em mínimo em relação ao direito social. Será que essa tese do mínimo
existencial não traz uma hierarquização em que se coloca antes os direitos
individuais e depois os direitos sociais, num retorno ao individualismo egoísta
de outrora? Na verdade, o problema da aplicabilidade dos direitos sociais pode
ser equacionado através de uma ponderação em que de um lado coloca-se o direito
social e do outro lado a justiça e a democracia.
No lugar do direitos humanos pode-se
colocar a dignidade humana. Para a realização da dignidade da pessoa humana é
essencial a efetivação dos direitos humanos. Assim o problema do mínimo
existencial é muito importante, mas não é o único critério.
Alguns chegam a defender a construção do
novo conceito de discricionariedade baseado na teoria do Garantismo Jurídico.
Existe uma divergência entre a normatividade e a efetividade, e o garantismo
seria forma de fazer a junção entre elas, garantindo os direitos humanos. Isso
vai implicar na necessidade de que só seja permitido ao agente público fazer
uso da discricionariedade a partir do momento em que a Administração tiver
satisfeito as necessidades básicas dos cidadãos, ou seja, a garantia do mínimo
necessário à sua dignidade, representado pelo atendimento aos direitos
fundamentais. Com isso, assegurar o mínimo necessário à dignidade humana
significa atender às demandas geradas pelos direitos fundamentais das
populações, especialmente as mais pobres, e que se constituem nas principais
destinatárias das políticas públicas para suprir necessidades vitais de
sobrevivência minimamente digna. Do ponto de vista de uma visão garantista do
controle da Administração, dado que esta deve atuar, em todos os momentos,
tendo a pessoa como centro de suas realizações, cabe ao Judiciário a avaliação
dos atos administrativos, sempre sob a perspectiva dos direitos fundamentais
constitucionais.
Se, não é possível transferir para o
Poder Judiciário a possibilidade de escolher quais políticas públicas são as
mais importantes, por outro lado ele é tão legitimado quanto os outros Poderes
para a efetivação dos direitos fundamentais. A ideia dos direitos fundamentais
é a concretização do meta-valor da dignidade da pessoa humana, isto é, tratar o
homem sempre como fim e nunca como meio, o homem como valor fonte de todo o
ordenamento jurídico e o Poder Judiciário é o guardião dele.
CONCLUSÃO
Os direitos humanos experimentam uma
situação contraditória nesta atual fase do Direito porque adquiriam inusitada
força normativa, mas são ameaçados de todos os lados. Afirmaram-se como baliza
da legitimidade institucional, mas sofrem rudes golpes de globalização
econômica. Exemplo disso é que, se por um lado, atualmente, existe uma grande
preocupação na tutela da dignidade da pessoa humana, por outro, evidenciam-se
lesões de toda ordem que aviltam essa mesma dignidade. Há um movimento mundial
para decretar o fim do Estado preocupado com o bem estar social de seus
cidadãos e um retorno ao Estado Liberal, absenteísta por natureza.
Uma certeza que essa atual e grave crise
econômica trouxe foi que não podemos abdicar de um Estado forte e
interveniente. Em todos os países, a unânime solução para essa grave crise
econômica que acomete o mundo está na maior intervenção do Estado na economia,
estatizando empresas e instituições financeiras e fomentando a produção e o
consumo em seus países. Essa forte intervenção do Estado na economia nos dias
de hoje simboliza para alguns estudiosos a necessidade do Estado de Bem Estar
Social
Na verdade, os valores que estão
presentes no conceito do Estado de Bem Estar Social e do Estado Democrático de
Direito são os valores humanitários, direitos humanos fundamentais, como
igualdade, liberdade, justiça e fraternidade e eles são conquistas de muitas
lutas da humanidade através dos séculos e nunca vão perecer. A dignidade da
pessoa humana, um dos fundamentos do Estado brasileiro, representa
significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor fonte que conforma e
inspira a Constituição e ordenamento jurídico dos Estados contemporâneos.
Nesse sentido, as normas programáticas de
uma Constituição não são simples programas, exortações morais, sentenças
políticas, mas as normas programáticas possuem valor jurídico constitucional
idêntico às outras normas constitucionais. Vinculam o legislador, na medida em
que são uma imposição constitucional, servindo como diretivas materiais,
vinculando todos os órgãos concretizadores não sendo apenas limites negativos.
Como consequência, podemos destacar a
legitimidade do Poder Judiciário e dos juízes no Brasil em atuar nas políticas
públicas a partir das normas programáticas é constitucional. São argumentos
favoráveis o art. 5º, XXXV que prescreve que “a lei não excluirá da apreciação
do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” e sua responsabilidade em
implementar a Constituição, efetiva e eficaz por natureza.
Em relação ao Ativismo Judicial, a
realidade é que o Brasil vive nos últimos 20 anos a paralisia dos poderes
Executivo e Legislativo e isso é responsável pelo atual protagonismo do
Judiciário. A rigor, o Poder Legislativo hoje não cumpre nenhum dos seus três
papéis institucionais: não legisla, não fiscaliza o Executivo e representa mal
o povo. O poder Executivo, por seu lado, constantemente está envolvido em
corrupção e gestão ineficiente. E, na medida em que o assunto está previsto na
Constituição, ele sai da esfera política, da deliberação parlamentar, e se
torna matéria de interpretação judicial. Então, em uma primeira abordagem, a
Constituição de 1988 contribuiu para que o Judiciário tenha um papel muito mais
ativo na vida do país. Mas há um segundo motivo para isso, pois o atual sistema
político brasileiro levou a um descolamento entre a sociedade civil e a classe
política.
O Judiciário é um poder constitucional
integrado a estrutura de governo. Ele administra a justiça. Atua no espaço
entre os outros poderes e o povo. Nesse universo, o sistema democrático tem na
magistratura um de seus elementos políticos essenciais. Sacrifica a
administração pública e mata a justiça o ato do juiz quando, por interesse
pessoal ou por receio de desagradar o poderoso, deixa de fazer justiça, sua
meta essencial. O poder de decidir demanda é estreitamente vinculado ao dever
de bem satisfazer o impulso ético. Nesse contexto, importante a tomada de
consciência da missão que distingue o Judiciário dos outros Poderes, que é a
busca por Justiça. E o instituto da Responsabilidade Civil do Estado vai
permitir a Justiça no caso individual, concreto.
Por regra constitucional, o poder
Judiciário é inerte. Ele só atua se for
provocado pelo cidadão. Vai caber ao cidadão que se vê prejudicado nos seus direitos
constitucionais por ação negligente, imperita ou imprudente da Administração
Pública ou por omissão de seus deveres constitucionais a ação contra ele. Os
administradores são eleitos com o objetivo de bem administrar o país e recebem
geralmente salários acima do mercado de trabalho com o intuito de dar o melhor
de si e demandar todos os esforços possíveis para concretizar os preceitos
constitucionais. Devem, portanto, responder civilmente por eventuais falhas de
suas ações e o instituto da Responsabilidade Civil se torna um bom meio para
fazer justiça no caso concreto pois permite condenar o governo por danos morais
e materiais pelas falhas na prestação do serviço público.
O que falta é uma maior consciência do
papel que a Constituição assume no ordenamento jurídico, bem como o
desconhecimento do papel do Judiciário frente a não implementação e não
realização dessa mesma Constituição. Deve o cidadão ter conhecimento dessas
possibilidades e não deixar de buscar o Poder Judiciário quando se vê
prejudicado pela Administração em seus direitos constitucionais e ao menos
conseguir uma reparação financeira através da condenação judicial por danos
morais e materiais. Vai compensar seus prejuízos e punir a administração e o
administrador demonstrado indiretamente o caminho correto, fazendo a Justiça individual
e social, bem o qual todos perseguimos.
REFERÊNCIAS
BARROSO,
Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 1° ed. Saraiva:
2008.
BONAVIDES,
Paulo. Curso de Direito Constitucional. 18° ed. São Paulo: Malheiros, 2006.
DINIZ,
Maria Helena. Direito Civil Brasileiro. 1º volume. 19° ed. São Paulo: Ed.
Saraiva, 2002.
MENDES,
Gilmar Ferreira et al. Curso de Direito Constitucional. 2° ed. São Paulo:
Saraiva, 2008.
SILVA,
José Afonso. Curso de Direito Constitucional. 31° ed. Rio de Janeiro: RT, 2007.
VIANNA, Luiz Werneck et al. A judicialização da política e das
relações sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Revan, 1999.