quarta-feira, 29 de junho de 2022

Justiça condena MBL a pagar R$ 50 mil a Duvivier por post sobre 'mamata' da Rouanet

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) condenou, nesta quarta-feira (29), o MBL (Movimento Brasil Livre) a pagar R$ 50 mil ao humorista e colunista da Folha Gregorio Duvivier por danos morais. O humorista Gregório Duvivier O humorista Gregório Duvivier - Álvoro Isidoro/Divulgação A decisão diz respeito a uma ação movida pelo artista. A defesa de Duvivier contestava um post, feito na conta do Facebook do MBL, que associava Duvivier a supostas irregularidades na utilização de recursos da Lei Rouanet. Na publicação, compartilhada em junho de 2016, o MBL fez uma montagem com as fotos de Gregorio Duvivier, do ator Wagner Moura e do cantor Tico Santa Cruz com a frase: "Chega de Lei Rouanet. Acabou a mamata". Inicialmente, o pedido foi julgado improcedente. Em decisão do ano passado, a juíza Katia Cilene da Hora Machado Bugarim, da 42ª Vara Cível do TJ-RJ, entendeu que não houve a prática dos crimes de injúria, calúnia e difamação contra Duvivier —que ingressou com recurso. Na ação, a defesa do humorista afirmou que foi alvo de uma exposição vexatória. Já o MBL disse que o post traz a imagem do humorista "sem a sua individualização, apenas por se tratar de uma figura pública e passível de críticas, para questionar a utilização de recursos públicos para obras privadas". Na tarde desta quarta, o recurso de apelação foi integralmente acolhido, por três votos a zero, pela 17ª Câmara Cível. Cabe recurso às instâncias superiores. "A disseminação de fake news é uma estratégia utilizada por esse grupo contra aqueles que consideram seus inimigos. O Gregorio Duvivier foi mais uma vítima e o TJ-RJ reconheceu isso de forma didática e exemplar", diz o advogado Paulo Petri, que faz a defesa do humorista.

Compra em sites falsos dá direito a indenização segundo STJ

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1925193 - RJ (2021/0194433-4) DECISÃO Trata-se de agravo interposto por B2W COMPANHIA DIGITAL, contra a decisão que inadmitiu o recurso especial. O apelo extremo fundamentado no art. 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição Federal desafia o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, assim ementado: "APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. COMPRA E VENDA DE PRODUTO VIA INTERNET. APARELHO CELULAR IPHONE. FRAUDE PRATICADA POR TERCEIROS AO CRIAR SITE FALSO SIMILAR AO DA RÉ AMERICANAS.COM E EMITIR BOLETO BANCÁRIO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA SEGUNDA RÉ. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. SOLIDARIEDADE. FRAUDE PRATICADA POR TERCEIRO QUE SE INSERE NO ÂMBITO DA ATIVIDADE EMPRESARIAL. TEORIA DO RISCO DO EMPREENDIMENTO. VERBETE SUMULAR 94 TJRJ. SÚMULA 479 DO STJ. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. SEGURANÇA. SENTENÇA QUE SE REFORMA PARA JULGAR PROCEDENTES OS PEDIDOS. DANO MORAL CONFIGURADO. PERDA DO TEMPO ÚTIL. SITUAÇÃO QUE ULTRAPASSA OS LIMITES DO MERO ABORRECIMENTO. QUANTUM INDENIZATÓRIO, ARBITRADO EM R$ 4.000,00 (QUATRO MIL REAIS), QUE SE REVELA ADEQUADO E PROPORCIONAL À HIPÓTESE DOS AUTOS, ESTANDO DE ACORDO COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. PROVIMENT O DO RECURSO" (fl. 295, e-STJ). No especial, a recorrente aponta além de dissídio jurisprudencial, violação do art. 14, § 3º, II, do Código de Defesa do Consumidor, defendendo a culpa de terceiro. Assegura que a recorrida foi vítima de fraude ao realizar a compra em site falso que parecia percenter a recorrente. Ressalta que nas compras realizadas pela internet os boletos bancários são gerados pelo Banco do Brasil e não pelo Banco Santander, como no caso dos autos. Aponta ainda, dissídio jurisprudencial ao argumento de que ocorrendo fraudes praticadas por terceiros, os Tribunais tem afastado o dever de indenizar. Postula ao final, a reforma do acórdão estadual para afastar a responsabilidade da recorrente, julgando improcedente o pedido autoral. Com as contrarrazões e inadmitido o recurso na origem, sobreveio o presente agravo, no qual se busca o processamento do apelo nobre. É o relatório. DECIDO. Ultrapassados os requisitos de admissibilidade do agravo, passa-se ao exame do recurso especial. O acórdão impugnado pelo presente recurso especial foi publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). A irresignação não merece prosperar. O Tribunal estadual ao dirimir a controvérsia fundamentou o seguinte: "(...) cuida -se de relação de consumo, razão pela qual o Código de Defesa do Consumidor é aplicável ao caso concreto, pois a autor a se tipifica no conceito de destinatário final contido no art. 2º da legislação consumerista. Por outro lado, inegável a qualidade de prestadores de serviço dos réus . Como se sabe, da aplicação dos ditames da Lei nº 8.078/90, decorre a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços, em relação aos danos causados aos c onsumidores por defeitos relativos à prestação daqueles tal como está consignado no artigo 14, caput e § 1º do CDC, mormente, ante ao descumprimento do dever de informação e quebra da legítima expectativa criada no consumidor. A propósito: (...) Inegável a aplicação da Teoria do Risco do Empreendimento, segundo a qual todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no campo do fornecimento de bens e serviços tem o dever de responder pelos fatos e vícios resultantes do empreendimento independentemente de culpa. Destaca-se que, consoante o dispositivo acima lançado, o serviço é considerado defeituoso quando não oferece ao consumidor a segurança ordinária que dele se espera. Nesse sentido, colaciona-se Verbete nº 94 da Súmula de Jurisprudência desta Corte, verbis: "Cuidando -se de fortuito interno, o fato de terceiro não exclui o dever do fornecedor de indenizar". (...) Com efeito, não se pode exigir do consumidor ordinário que identifique fraudes eletrônicas. E, não obstante, o valor pago tenha sido de aproximadamente 1/3 do preço real do produto, tem-se que a primeira ré trata-se de empresa conhecida por fazer promoções periódicas e tem fama notável no meio empresarial, o que justifica que a autora tenha confiado na marca e, assim, não diligenciou mais cuidadosamente, o que se faz quando se trata de site desconhecido do público. Por certo que a marca consagrada no mercado gera uma confiança maior no consumidor. De modo que se revela crível que a autora não tenha desconfiado da promoção e tenha prosseguido com a compra, sem verificar outros detalhes, visto que as operações via internet tem por característica também a celeridade. (...) Nessa esteira, reputo configurada a obrigação solidária de entregar o produto descrito na inicial ou de indenizar a autora, pelo montante desembolsado, bem como de compensar o dano moral" (fl. 304-312, e-STJ - grifou-se). Dessa forma, rever o entendimento do acórdão impugnado a fim de afastar o dano sofrido pela parte recorrida, demandaria o reexame do contexto fático-probatório, procedimento inadmissível no âmbito de recurso especial, nos termos da Súmula nº 7/STJ: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial". Nesse sentido: "AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ? AÇÃO CONDENATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA DA PRESIDÊNCIA DESTA CORTE QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA RECURSAL DA PARTE DEMANDADA. 1. O Tribunal de origem, após apreciar o acervo fático-probatório dos autos, constatou a falha na prestação dos serviços por parte da instituição financeira e reconheceu o dever de indenizar a parte recorrida a título de danos morais. Derruir tal conclusão demandaria necessariamente do revolvimento de fatos e provas e do contrato de prestação de serviços existente entre as partes, o que é vedado em sede de recurso especial, ante a incidência das Súmulas 5 e 7 do STJ. 2. A incidência das Súmulas 5 e 7 do STJ impede o conhecimento do recurso lastreado na alínea ?c? do inciso III do art. 105 da Constituição Federal, ante a inexistência de similitude fática. Precedentes. 3. Agravo interno desprovido" (AgInt no AREsp 1.738.574/RJ, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 31/05/2021, DJe 04/06/2021). "AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. ILEGITIMIDADE PASSIVA. CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIRO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. NULIDADE DA ?TAXA DE FINANCIADOR? (OU INTERVENIÊNCIA BANCÁRIA). SÚMULA 7 DO STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. A matéria prevista no art. 14, § 3º, I e II, do Código de Defesa do Consumidor, não foi objeto de debate no acórdão recorrido, nem nos embargos de declaração opostos. A falta do necessário prequestionamento inviabiliza o exame da alegada contrariedade ao dispositivo citado por este Tribunal, em sede de especial. Incidência na espécie da Súmula 211/STJ. 2. Além disso, a convicção a que chegou o acórdão acerca da nulidade da ?Taxa de Financiador? (ou Interveniência Bancária) e da responsabilidade da recorrente quanto à repetição do indébito, decorreu da análise do conjunto fático-probatório, e o acolhimento da pretensão recursal demandaria o reexame do mencionado suporte, obstando a admissibilidade do especial à luz do enunciado 7 da Súmula desta Corte. 3. Agravo interno não provido" (AgInt no REsp 1.858.841/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 24/05/2021, DJe 27/05/2021). "AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. 1. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. QUESTÕES DEVIDAMENTE ANALISADAS PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. 2. ALEGAÇÃO DE RESCISÃO UNILATERAL DO CONTRATO PELO RECORRIDO. IMPOSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO DO ESPECIAL NESSE PONTO. INCIDÊNCIA DOS ÓBICES PROCESSUAIS DAS SÚMULAS 5 E 7 DO STJ. 3. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Não se verifica a apontada violação ao art. 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, pois todas as questões suficientes ao deslinde da controvérsia foram devidamente analisadas pelo Tribunal de origem. 2. Para reformar o que ficou decidido pelas instâncias ordinárias acerca da responsabilidade do banco recorrido, seria necessário proceder à interpretação das cláusulas contratuais, bem como reexaminar o conjunto fático-probatório dos autos, procedimentos vedados pelas Súmulas 5 e 7 do STJ. 3. Agravo interno desprovido" (AgInt no AREsp 1.511.250/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/04/2020, DJe 24/04/2020). Não bastasse isso, observa-se que a decisão do Tribunal local encontra-se em harmonia com a jurisprudência desta Corte Superior. Esse ademais, o enunciado da Súmula 479/STJ, "as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias" A propósito: "RECURSO ESPECIAL. CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS. FRAUDE. COMPRA ON-LINE. PRODUTO NUNCA ENTREGUE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SERVIÇOS BANCÁRIOS. INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA ENTRE PARTICULARES. COMPRA E VENDA ON-LINE. PARTICIPAÇÃO. AUSÊNCIA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. NÃO CONFIGURAÇÃO. 1. Ação ajuizada em 30/06/2015. Recurso especial interposto em 16/03/2018 e atribuído em 22/10/2018. 2. O propósito recursal consiste em determinar se o banco recorrido seria objetivamente responsável pelos danos suportados pelo recorrente, originados após ter sido vítima de suposto estelionato, perpetrado na internet, em que o recorrente adquiriu um bem que nunca recebeu. 3. Nos termos da Súmula 479/STJ, ?as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias?. (...) 6. Recurso especial não provido" (REsp 1.786.157/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/09/2019, DJe 05/09/2019). "AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO RESTRITIVO DE CRÉDITO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. HARMONIA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INADMISSIBILIDADE. 1. ?As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno? (REsp 1.197.929/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, DJe de 12.9.2011). 2. O Tribunal de origem julgou nos moldes da jurisprudência desta Corte. Incidente, portanto, a Súmula 83/STJ. 3. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria de fato (Súmula 7/STJ). 4. Agravo interno a que se nega provimento" (AgInt no AREsp 1.158.721/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 08/05/2018, DJe 15/05/2018). "AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTRATOS BANCÁRIOS. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS. DANOS CAUSADOS POR FRAUDES OU DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS. RISCO DO EMPREENDIMENTO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ENTENDIMENTO EXARADO NO REGIME DE JULGAMENTO DE RECURSOS REPETITIVOS. TEMA N. 466. ACÓRDÃO RECORRIDO CONFORME A ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL. RAZÕES RECURSAIS INSUFICIENTES. AGRAVO DESPROVIDO. 1. ?As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno?. 2. Razões recursais insuficientes para a revisão do julgado. 3. Agravo interno desprovido" (AgInt no AREsp 1.061.237/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe 02/08/2017). Ante o exposto, conheço do agravo para negar provimento ao recurso especial. Na origem, os honorários sucumbenciais foram fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, os quais devem ser majorados para 15% (quinze por cento) em favor do advogado da parte recorrida, nos termos do art. 85, § 11, do Código de Processo Civil de 2015, observado o benefício da gratuidade da justiça, se for o caso. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 26 de novembro de 2021. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA Relator (AREsp n. 1.925.193, Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe de 06/12/2021.)

segunda-feira, 27 de junho de 2022

Vazamento de dados é criminoso e cabe indenização,

O relato da atriz Klara Castanho, 21, sobre o vazamento de informações do seu prontuário médico expõe falhas graves do hospital e de profissionais que têm a obrigação legal de proteger o sigilo da paciente, segundo gestores hospitalares e advogados. Klara revelou no sábado (25) que foi vítima de um estupro e manteve a gestação, entregando a criança para adoção após o nascimento. A atriz relatou que, ainda sob o efeito da anestesia do parto, uma enfermeira entrou na sala cirúrgica e a ameaçou com o vazamento de informações sobre a situação. A atriz Klara Castanho, que teve informações do prontuário médico violadas em hospital - Facebook "Ela fez perguntas e ameaçou: ‘Imagina se tal colunista descobre essa história’. Eu estava dentro de um hospital, um lugar que era para supostamente para me acolher e proteger. Quando cheguei no quarto já havia mensagens do colunista, com todas as informações", escreveu Klara nas redes sociais. Neste domingo (26), o Hospital Brasil, que pertence à Rede D´Or e fica na Grande São Paulo, informou em nota que abriu uma sindicância interna para a apuração desse fato. Disse ainda que tem como princípio preservar a privacidade de seus pacientes bem como o sigilo das informações do prontuário médico. "O hospital se solidariza com a paciente e familiares", diz a nota. Também neste domingo, o Coren (Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo) anunciou que vai apurar a denúncia envolvendo a profissional de enfermagem. Em última instância, a enfermeira pode perder o registro profissional. Na opinião do advogado Josenir Teixeira, consultor jurídico na área da saúde, o vazamento do prontuário do paciente é criminoso. "Expõe as mais íntimas entranhas físicas e psíquicas do ser humano." O médico e doutor em administração de empresas Walter Cintra Ferreira Júnior, professor de administração hospitalar da FGV (Fundação Getulio Vargas), tem a mesma opinião. "É uma ação criminosa. Mesmo antes da LGPD [Lei Geral de Proteção de Dados], isso já estava caracterizado. Precisa averiguar, todo mundo tem direito à ampla defesa, mas que sejam feitas as punições devidas porque isso tudo é um verdadeiro horror." Segundo Teixeira, os fatos relatados pela atriz, se confirmados, demonstram a violação de artigos da Constituição Federal, do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor, além de resoluções dos conselhos profissionais. Além de poder ser demitida por justa causa, a enfermeira também poderá ser investigada em inquérito policial e se tornar ré em ação criminal. Também pode ser julgada pelo descumprimento do código de ética. Se houver inquérito policial ou ação penal, poderá ser aplicado o artigo 154 do Código Penal, que diz que a revelação de informações sigilosas e que possam trazer prejuízos ou danos a outrem é passível de detenção até um ano ou multa. "A infração a este artigo será investigado pelo inquérito policial e, ao final dele, o promotor de Justiça poderá denunciá-la ao juiz. Caso este aceite a denúncia, inicia-se o processo pena, que poderá condenar a enfermeira na pena prevista no artigo", explica Teixeira. ​Segundo o advogado, as ações indenizatórias podem ser movidas contra o hospital (pessoa jurídica) e a enfermeira (pessoa física). "A enfermeira deve ser empregada do hospital, o que o coloca em posição de solidariedade com ela no pagamento de indenização." Para Ferreira Júnior, é preciso que o caso sirva de alerta para que os hospitais e profissionais de saúde revisem seus códigos de conduta. Ele lembra, por exemplo, de um episódio de quando era diretor de um hospital público em que uma faxineira espalhou na comunidade onde morava que um paciente da instituição, que era seu vizinho, havia morrido de Aids.

sábado, 25 de junho de 2022

Faculdade de odontologia é condenada por tratamento mal executado

É dever do profissional de saúde elaborar um prontuário com todas as informações do paciente e do tratamento. Com esse entendimento, a 10ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou a condenação de uma faculdade de odontologia a indenizar uma paciente em R$ 30 mil, a título de danos morais, por um tratamento mal executado. A decisão se deu por unanimidade. De acordo com os autos, a paciente se submeteu a um tratamento para implantação de prótese dentária com profissionais que atendiam na clínica da faculdade. Porém, o tratamento não deu o resultado esperado, levando a paciente a acionar o Judiciário. Perícia anexada aos autos apontou uma série de falhas no atendimento e concluiu pelo comprometimento estético, fonético e mastigatório da autora. Para o relator, desembargador Márcio Boscaro, há claro nexo causal entre a ação da faculdade de odontologia e o resultado verificado na condição bucal da autora, pois não foi sanado o quadro que ela apresentava e que fez com que buscasse tais serviços profissionais. Assim, o magistrado manteve a condenação da ré a indenizar a paciente. "Além dos serviços inadequadamente prestados, conforme então constatado, tem-se que a autora tampouco recebeu adequadas informações quanto à sua situação pessoal, antes de iniciado o tratamento, e nem mesmo lhe foi solicitado o devido consentimento para a realização do procedimento aplicado, em que avulta a absoluta falta de êxito quanto aos fins buscados", afirmou. Segundo o relator, aplica-se ao caso a regra do artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, dada a verossimilhança das alegações apresentadas pela autora (e confirmadas pelas conclusões a que chegou o perito judicial), bem como em virtude de sua hipossuficiência em face da faculdade. "É dever legal do profissional de saúde elaborar minudente prontuário descrevendo todas as intercorrências havidas com a paciente, ao longo do tratamento a que a submeteu, o que não ocorreu, no presente caso. Nesse quadro, não se pode presumir a adoção de procedimentos adequados em detrimento do consumidor, sendo certo que a regra consumerista supra referida aponta em sentido contrário", disse. Diante da conclusão da perícia de que houve falhas no serviço prestado pela faculdade de odontologia, além da ausência de um planejamento adequado do tratamento que seria dispensado à autora e da obtenção de consentimento informado, Boscaro concluiu que a ré deve ser responsabilizada pelos danos causados à paciente. "Em virtude disso, padeceu a autora inegáveis danos morais, pelas agruras sofridas ao longo desse malogrado tratamento, que deixou sua saúde bucal em situação pior do que se encontrava, antes de seu início. Nesse passo, tem-se que os fatos narrados nos autos comprovamque a situação experimentada pela autora indubitavelmente ultrapassou os limites do razoável e do mero aborrecimento, a atingir sua esfera moral, dando inegável ensejo à reparação civil indenizatória", completou. Clique aqui para ler o acórdão Processo 0071942-61.2011.8.26.0114 Tábata Viapiana é repórter da revista Consultor Jurídico.

Pastor Silas Malafaia faz acordo para não ser denunciado por crimes contra Felipe Neto

Por Ana Cláudia Guimarães 24/06/2022 • 18:36 Silas Malafaia faz acordo para não ser denunciado por crimes contra Felipe NetoSilas Malafaia faz acordo para não ser denunciado por crimes contra Felipe Neto | Reprodução O pastor Silas Malafaia, em audiência realizada no 9ª Juizado Especial Criminal, na Barra, aceitou a proposta da chamada transação penal (espécie de acordo) apresentada pelo Ministério Público para não ser denunciado em dois processos pelos crimes de injúria e difamação praticados contra o youtuber Felipe Neto. O líder religioso terá de desembolsar 20 salários mínimos (R$ 24.240) para aquisição de objetos e bens materiais de uso e consumo, em favor da Associação Solidários Amigos de Betânia, na Praça Nossa Senhora do Loreto, Jacarepaguá, Zona Oeste da cidade. A instituição acolhe homens, moradores em situação de rua, com vulnerabilidade social.

Gregorio Duvivier perde processo e terá de pagar R$ 25 mil a Luciano Hang

A Justiça do Rio de Janeiro negou um recurso de Gregorio Duvivier e manteve a obrigação de o humorista arcar com uma indenização a Luciano Hang, dono da rede de lojas Havan. Com a decisão em segunda instância, o ator precisará pagar R$ 25 mil ao empresário. Pelas redes sociais, Hang comemorou: "Ele estava precisando de um minuto de fama". O processo foi iniciado após um tuíte de 2019, no qual Duvivier escreveu: "Tô tão triste, alguém mata o 'Véio da Havan'". Por unanimidade, os desembargadores do TJRJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro) afirmaram que o comediante agiu por excesso e motivou a incitação à violência.Na época, Duvivier alegou que o processo feria os princípios de liberdade de expressão e, pelas redes sociais, explicou que o comentário era só uma piada.

quinta-feira, 23 de junho de 2022

STJ diverge sobre obrigação de dividir custos de pet após separação do casal

A possibilidade de obrigar uma pessoa a dividir com o ex-companheiro os gastos com os cachorros adquiridos pelo casal durante a união estável gerou divergência na 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. Retomado nesta terça-feira (21/6), o julgamento foi novamente interrompido por pedido de vista. Autora da ação pediu ao ex-companheiro para indenizá-la por cinco anos de gastos com os pets desde o fim da união estável 123RF O caso trata de um casal que viveu em união estável entre 2007 e 2012, período em que adquiriram seis cachorros. Com o fim da relação, em março de 2013 a ex-companheira assumiu para si a posse dos pets, que julgava estarem abandonados no sítio do ex-companheiro. Em 2017, ela ajuizou uma ação para cobrar dele o pagamento de metade do valor das despesas que teve com os animais, de R$ 750 por mês. O pedido era para obriga-lo a ressarci-la em R$ 39,5 mil, além de obriga-lo a dividir os custos até a morte ou alienação de todos os pets. As instâncias ordinárias julgaram a ação parcialmente procedente. O ex-companheiro foi condenado a pagar R$ 19,7 mil, as despesas mensais vencidas durante o processo e os custos até que os pets serem alienados (doados ou vendidos) ou falecerem. Relator, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva votou por manter essa obrigação. Para ele, impor os custos apenas à ex-companheira configura abuso de direito, pois a aquisição dos animais de forma conjunta impôs o dever equânime de cuidar dos mesmos. Abriu a divergência o ministro Marco Aurélio Bellizze. Para ele, o ex-companheiro não deve ser obrigado a arcar com os custos, pois a relação entre dono e animal é regida pelo direito de propriedade. E no caso, é incontroverso que a dona exclusiva é a ex-companheira, a quem cabe arcar com os custos dos animais. O tema é inédito no STJ. Até então, a corte só tem precedente que trata de direito de visita a animal de estimação após separação, julgado pela 4ª Turma em 2018. Pediu vista a ministra Nancy Andrighi, que prometeu refletir sobre o caso nas férias de julho, acompanhada de seus cachorros. Para ministro Cueva, a aquisição conjunta de pets impõe o equânime dever de cuidado Divulgação/Flickr STJ Não se trata de pensão Tanto o relator quando o voto-divergente rechaçaram qualquer aplicação das regras do direito civil quanto à pensão alimentícia. Segundo o ministro Cueva, na ausência de lei específica sobre o tema, a ação deve ser julgada a partir da analogia, dos costumes e dos princípios gerais do direito, conforme prevê a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Lindb). Ele destacou que há princípios constitucionais e legais que impõe aos donos de pet o dever de cuidado, os quais foram violados pelo ex-companheiro. 'Pretender carrear tal compromisso apenas à autora materializa inequívoco abuso de direito", entendeu o relator, que votou por negar provimento ao recurso especial. "Assim, a aquisição conjunta de animais por ex-companheiros impõe o equânime dever de cuidado e de subsistência digna desses até sua morte ou alienação", resumiu. Para ministro Bellizze, o custeio dos pets cabe apenas a quem for o proprietário Lucas Pricken/STJ Direito de propriedade Já para o ministro Bellizze, a relação entre dono e animal se situa no âmbito do direito de propriedade e no direito das coisas. Ou seja, sofre o reflexo das normas que definem o regime de bens — no caso, da união estável —, cuja aplicação deve levar em conta a natureza particular dos animais de estimação, seres dotados de sensibilidade. Por isso, entendeu que a conclusão admitida pelo relator não é cabível. Não se pode permitir que a única dona dos animais, que usufrui sozinha da companhia deles, pleiteie o pagamento de despesa a quem não detém a propriedade e sequer manteve vínculo sentimental. "O fato de os animais de estimação terem sido adquiridos na vigência da união estável não pode representar a consolidação de um vínculo obrigacional indissolúvel", disse o ministro Bellizze. "O único vínculo de custear a sobrevivência de outro ser vivo independentemente da ruptura da relação conjugal ou vivencial decorre da relação de filiação", ressaltou. REsp 1.944.228 Danilo Vital é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília. Revista Consultor Jurídico, 22 de junho de 2022, 11

Demora excessiva em atendimento bancário gera dano moral in re ipsa

Em 24/5/2022, a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob a relatoria do ministro Villas Bôas Cueva, afetou o Recurso Especial (REsp) 1.962.275/GO ao rito dos recursos repetitivos (RR), bem como determinou a suspensão da tramitação dos REsps e AREsps cujos objetos coincidam com o da matéria afetada. A questão jurídica que a Corte vai definir é "se a demora na prestação de serviços bancários superior ao tempo previsto em legislação específica gera dano moral individual in re ipsa apto a ensejar indenização ao consumidor". O REsp em questão, indicado pelo tribunal de origem como representativo da controvérsia, foi interposto pelo Banco do Brasil contra o julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) 5273333.26.2019.8.09.0000 pelo Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) que, em 12/08/2020 fixou, por unanimidade de votos do Órgão Especial, esta tese: “A demora excessiva na prestação dos serviços bancários presenciais em prazo superior aos definidos em legislação específica gera dano moral passível de reparação; Em casos que tais, o dano moral é presumido (in re ipsa) e, portanto, prescinde de prova de sua ocorrência por parte do consumidor, não obstante, admita a produção de prova em contrário (juris tantum)”. Tal IRDR fora suscitado em 4/4/2019 pelo desembargador Marcus da Costa Ferreira, nos autos da Apelação Cível 0336291.61.2015.8.09.0134 do TJ-GO, diante da "existência de várias ações ajuizadas versando sobre o mesmo tema, com entendimentos opostos e conflitantes, [...] com risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica". A questão jurídica agora submetida à 2ª Seção do STJ permitirá a construção de um precedente qualificado pelo rito dos RR, cujo objetivo, nas palavras do ministro presidente da Comissão Gestora de Precedentes, é "evitar decisões divergentes nas instâncias de origem e o envio desnecessário de [REsps e/ou AREsps] a esta Corte Superior, cumprindo com uma das finalidades dos precedentes qualificados [...] que é o de servir como instrumento processual à disposição do [STJ] capaz de pacificar, em âmbito nacional, questões de direito relevantes ou que se repetem em múltiplos processos" [2]. Ou seja, a tese a ser definida nesse RR será aplicada a todos os feitos em tramitação no território nacional com fundamento em idêntica questão de direito. Com efeito, a controvérsia sobre a reparabilidade do tempo de espera excessivo para atendimento bancário precisa ser dirimida pela Corte Superior, tendo em vista a existência de entendimentos divergentes nas duas turmas especializadas em Direito Privado. Exemplificando, de um lado a 3ª Turma assentou, no REsp 1.737.412/SE relatado pela ministra Nancy Andrighi e julgado em 5/2/2019, que "o desrespeito voluntário das garantias legais, com o nítido intuito de otimizar o lucro em prejuízo da qualidade do serviço, revela ofensa aos deveres anexos ao princípio boa-fé objetiva e configura lesão injusta e intolerável à função social da atividade produtiva e à proteção do tempo útil [3] do consumidor". "Na hipótese concreta, a instituição financeira recorrida optou por não adequar seu serviço aos padrões de qualidade previstos em lei municipal e federal, impondo à sociedade o desperdício de tempo útil [4] e acarretando violação injusta e intolerável ao interesse social de máximo aproveitamento dos recursos produtivos, o que é suficiente para a configuração do dano moral coletivo." Em 22/2/2022 a 3ª Turma reforçou, no REsp 1.929.288/TO também relatado pela ministra Nancy Andrighi, que "a responsabilização por dano moral coletivo se verifica pelo simples fato da violação, isto é, in re ipsa, não havendo que se falar, portanto, em ausência de prova do dano na hipótese em apreço". "A inadequada prestação de serviços bancários, caracterizada pela reiterada existência de caixas eletrônicos inoperantes, sobretudo por falta de numerário, e pelo consequente excesso de espera em filas por tempo superior ao estabelecido em legislação municipal, é apta a caracterizar danos morais coletivos." De outro lado, a 4ª Turma sustentou, no REsp 1.647.452/RO relatado pelo ministro Luis Felipe Salomão e julgado em 26/2/2019, que "o direito à reparação de dano moral exsurge de condutas que ofendam direitos da personalidade, bens tutelados que não têm, per se, conteúdo patrimonial, mas extrema relevância conferida pelo ordenamento jurídico. A espera em fila de banco, supermercado, farmácia, e em repartições públicas, dentre outros setores, em regra, é mero desconforto que não tem o condão de afetar direito da personalidade, isto é, interferir intensamente no equilíbrio psicológico do consumidor do serviço (saúde mental)". Em 24/11/2020, noutra causa em que "a instituição financeira [não se empenhou] em dar ao caso resolução satisfatória, na esfera extrajudicial, obrigando o consumidor a lavrar boletim de ocorrência em repartição policial e em seguida contratar advogado para trazer o caso para ser resolvido pelo Poder Judiciário", a 4ª Turma reiterou, no REsp 1.406.245/SP também relatado pelo ministro Salomão, que "o direito à compensação de dano moral, conforme a expressa disposição do artigo 12 do CC, exsurge de condutas que ofendam direitos da personalidade [...], bens tutelados que não têm, per se, conteúdo patrimonial, mas extrema relevância conferida pelo ordenamento jurídico [...]. Nessa linha de intelecção, como pondera a abalizada doutrina especializada, mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia, [...] tais situações não são tão intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo". Para que se possa solucionar adequadamente tal divergência jurisprudencial, entendo que seja preciso revisitar os institutos do "dano" e do "dano moral", uma vez que eles são abordados pela doutrina brasileira sob diferentes perspectivas e com nomenclaturas variadas, o que não raro gera problemas na sua compreensão e aplicação. Quanto ao dano, Junqueira de Azevedo, Silvano Flumignan, Caitlin Mulholland, Francisco Amaral e Fernando Noronha convergem no entendimento de que a lesão a um bem jurídico, enquanto objeto de um direito, atingirá interesse alheio, que é pressuposto do direito violado, podendo desse fato resultar um prejuízo. Nesse sentido, a lesão a direito alheio ou a interesse juridicamente tutelado caracteriza o dano-evento, que é um fato antijurídico, enquanto a consequência prejudicial dessa lesão configura o dano-resultado, que é o dano em sentido estrito ou propriamente dito [5]. Logo é possível conceituar dano-evento como a lesão a direito alheio ou a interesse juridicamente tutelado, e dano-resultado como o prejuízo decorrente da lesão a um bem, material ou imaterial, juridicamente tutelado. No tocante ao dano moral, Noronha alerta que, no Brasil, existe uma "tradicional confusão entre danos extrapatrimoniais e morais [...] presente em praticamente todos os autores justamente reputados como clássicos nesta matéria, desde Aguiar Dias até Carlos Alberto Bittar e Yussef S. Cahali" e, em atenção àquela "designação tradicional", o autor sustenta que os danos extrapatrimoniais podem ser chamados de "danos morais em sentido amplo” e que os danos morais anímicos podem ser denominados “danos morais em sentido estrito" [6]. Em face dessa realidade, é possível inferir que o dano extrapatrimonial é o gênero, e que o dano moral anímico é uma espécie dele. Contudo, considerando-se que no Brasil os danos extrapatrimoniais são costumeiramente designados de "danos morais", há a necessidade de se reconhecer a existência — e assim se fazer a distinção — do dano moral lato sensu, como gênero, do dano moral stricto sensu, como espécie dele. Nesse diapasão, pode-se afirmar que o dano moral lato sensu, enquanto gênero que corresponde ao dano extrapatrimonial, é o prejuízo não econômico que decorre da lesão a bem extrapatrimonial juridicamente tutelado, abrangendo os bens objeto dos direitos da personalidade, ao passo que o dano moral stricto sensu, enquanto espécie do dano extrapatrimonial (ou moral lato sensu), é o prejuízo não econômico que decorre da lesão à integridade psicofísica da pessoa — cujo resultado geralmente são sentimentos negativos como a dor e o sofrimento [7]. Ao estudar a problemática na Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor [8] — que identificou e valorizou o "tempo do consumidor" como um bem jurídico —, percebi que não se sustentava a compreensão de que a via crucis enfrentada pelo consumidor, diante de um problema de consumo criado pelo próprio fornecedor, representaria "mero aborrecimento", e não algum dano ressarcível. O substantivo "aborrecimento" traduz um sentimento negativo qualificado pelo adjetivo "mero", que significa simples, comum, trivial. Em outras palavras, a jurisprudência baseada na tese do "mero aborrecimento" está implicitamente afirmando que, em determinada situação, houve lesão à integridade psicofísica de alguém apta a gerar um sentimento negativo ("aborrecimento"). Porém, segundo se infere dessa jurisprudência, tal sentimento é trivial ou sem importância ("mero"), portanto incapaz de romper o equilíbrio psicológico da pessoa e, consequentemente, de configurar o dano moral reparável. De fato, essa jurisprudência tradicional revela um raciocínio erigido sobre bases equivocadas que, naturalmente, conduzem a essa conclusão errônea. O primeiro equívoco é que o conceito de dano moral enfatizaria as consequências emocionais da lesão, enquanto ele já evoluiu para centrar-se no bem jurídico atingido; ou seja, o objeto do dano moral era essencialmente a dor, o sofrimento, o abalo psíquico, e se tornou a lesão a qualquer bem extrapatrimonial juridicamente tutelado, abrangendo os bens objeto dos direitos da personalidade. O segundo equívoco é que, nos eventos de desvio produtivo, o principal bem jurídico atingido seria a integridade psicofísica da pessoa consumidora, enquanto, na realidade, são o seu tempo vital e as atividades existenciais que cada pessoa escolhe nele realizar — como trabalho, estudo, descanso, lazer, convívio social e familiar. O terceiro equívoco é que esse tempo existencial não seria juridicamente tutelado, enquanto, na verdade, ele se encontra protegido tanto no rol aberto dos direitos da personalidade quanto no âmbito do direito fundamental à vida. Por conseguinte o lógico é concluir que os eventos de desvio produtivo do consumidor acarretam, no mínimo, dano moral lato sensu compensável. Ocorre que o tempo é o suporte implícito da vida, que dura certo tempo e nele se desenvolve, e a vida, enquanto direito fundamental, constitui-se das próprias atividades existenciais que cada um escolhe nela realizar. Logo um evento de desvio produtivo traz como resultado um dano que, mais do que moral, é existencial pela alteração prejudicial do cotidiano e/ou do projeto de vida do consumidor [9]. Ademais, considerando-se que todo dano pressupõe algum prejuízo para o titular do direito violado, o dano extrapatrimonial (ou moral lato sensu) que decorre do desvio produtivo do consumidor é presumido (in re ipsa), porque o prejuízo existencial é deduzido de dois postulados assim enunciados: o tempo é um recurso produtivo limitado, que não pode ser acumulado nem recuperado ao longo da vida das pessoas; e ninguém pode realizar, ao mesmo tempo, duas ou mais atividades de natureza incompatível ou fisicamente excludentes, do que resulta que uma atividade preterida no presente, em regra, só poderá ser realizada no futuro deslocando-se no tempo outra atividade. Em resumo, o conceito de dano moral ampliou-se ao longo dos anos, partindo da noção de dor e sofrimento anímico para alcançar, atualmente, o prejuízo não econômico decorrente da lesão a bem extrapatrimonial juridicamente tutelado, compreendendo os bens objeto dos direitos da personalidade — como o "tempo" da pessoa humana. Essa ampliação conceitual vem permitindo o reconhecimento de novas categorias de danos extrapatrimoniais para além da esfera anímica da pessoa — como o dano temporal, o dano existencial —, bem como a reparação autônoma de mais de uma espécie deles originária do mesmo evento danoso [10]. A Teoria do Desvio Produtivo promoveu a ressignificação e a valorização do tempo vital do consumidor — elevando-o à categoria de um bem jurídico —, vem possibilitando a crescente superação da jurisprudência baseada na tese do "mero aborrecimento" — que fora construída sobre bases equivocadas —, contribuiu para a ampliação do conceito de dano moral — apontando esse tempo do consumidor como um bem extrapatrimonial juridicamente tutelado — e ensejou o surgimento de uma nova jurisprudência brasileira — a do "desvio produtivo do consumidor" [11]. Diante desses fundamentos jurídicos, é forçoso concluir que a demora excessiva na prestação de serviços bancários, em tempo superior ao previsto na legislação de regência, gera dano moral lato sensu presumido (in re ipsa) pela lesão ao tempo existencial do consumidor, ensejando sua reparação quer em ação individual quer em tutela coletiva. Por outro prisma, a necessária redução do volume de processos com fundamento no desvio produtivo do consumidor, que sobrecarregam o Poder Judiciário tendo geralmente no polo passivo grandes fornecedores litigantes habituais, deve ser buscada pela concretização das funções preventiva e punitiva da responsabilidade civil, assim estimulando o desenvolvimento de uma nova cultura empresarial da qualidade de atendimento ao vulnerável. Afinal, o consumidor que é bem atendido não precisa ser defendido. [2] STJ, REsp 1.962.275/GO, despacho de 20-10-2021, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino. Disponível em: [www.stj.jus.br]. Acesso em: 16-06-2022. [3] Sempre registro que, no contexto da teoria pioneira que desenvolvi, é inadequada a utilização da nomenclatura “tempo útil” e “tempo livre”. Denominá-lo “útil” implicaria reconhecer que existe algum tempo “inútil” na vida humana, e chamá-lo de “livre” desconsidera que todo tempo é “ocupado”, do ócio ao negócio. Prefiro designar esse valioso bem jurídico de “tempo vital ou existencial” (DESSAUNE, Marcos. Teoria aprofundada do desvio produtivo do consumidor... 2. ed. Vitória: Ed. do Autor, 2017. p. 162-164). [4] Idem. [5] AZEVEDO, 2004; FLUMIGNAN, 2015; MULHOLLAND, 2009; AMARAL, 2018; NORONHA, 2013. [6] NORONHA, Fernando. Direito das obrigações. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 591. [7] AMARAL, 2018; NORONHA, 2013. [8] DESSAUNE, 2017, passim. [9] ALMEIDA NETO, Amaro de. Dano existencial... RT, São Paulo, v. 6, n. 24, out.-dez. 2005. passim. [10] BARROSO, Lucas A.; DIAS, Eini R. O dano psíquico nas relações civis e de consumo. RDC, São Paulo, v. 94, 2014. p. 93-94. [11] Disponível em: [www.conjur.com.br/2021-nov-10/garantias-consumo-ampliacao-conceito-dano-moral-superacao-tese-mero-aborrecimento]. Acesso em: 17-06-2022. Marcos Dessaune é advogado e autor da Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor. Membro do Instituto Brasilcon. Revista Consultor Jurídico, 22 de junho de 2022, 8h00