Compartilhar notícias jurídicas, jurisprudências e doutrinas e apresentar dicas sobre direitos dos cidadãos.
quinta-feira, 28 de julho de 2022
Planos de Saúde: Rol da ANS é taxativo, com possibilidades de cobertura de procedimentos não previstos na lista
Em julgamento finalizado nesta quarta-feira (8), a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu ser taxativo, em regra, o rol de procedimentos e eventos estabelecido pela Agência Nacional de Saúde (ANS), não estando as operadoras de saúde obrigadas a cobrirem tratamentos não previstos na lista. Contudo, o colegiado fixou parâmetros para que, em situações excepcionais, os planos custeiem procedimentos não previstos na lista, a exemplo de terapias com recomendação médica, sem substituto terapêutico no rol, e que tenham comprovação de órgãos técnicos e aprovação de instituições que regulam o setor.
Por maioria de votos, a seção definiu as seguintes teses:
1. O rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar é, em regra, taxativo;
2. A operadora de plano ou seguro de saúde não é obrigada a arcar com tratamento não constante do rol da ANS se existe, para a cura do paciente, outro procedimento eficaz, efetivo e seguro já incorporado ao rol;
3. É possível a contratação de cobertura ampliada ou a negociação de aditivo contratual para a cobertura de procedimento extra rol;
4. Não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do rol da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente, desde que (i) não tenha sido indeferido expressamente, pela ANS, a incorporação do procedimento ao rol da saúde suplementar; (ii) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências; (iii) haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como Conitec e Natjus) e estrangeiros; e (iv) seja realizado, quando possível, o diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde, incluída a Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, sem deslocamento da competência do julgamento do feito para a Justiça Federal, ante a ilegitimidade passiva ad causam da ANS.
Em relação às quatro condicionantes do item "4", a seção citou os enunciados 23, 33 e 97 das Jornadas de Direito em Saúde.
Prevaleceu na sessão a posição do relator, ministro Luis Felipe Salomão, que incorporou em seu voto acréscimos trazidos em voto-vista pelo ministro Villas Bôas Cueva, apresentado nesta quarta. Também votaram com o relator os ministros Raul Araújo, Isabel Gallotti, Marco Buzzi e Marco Aurélio Bellizze.
Ficaram vencidos no julgamento a ministra Nancy Andrighi, e os ministros Paulo de Tarso Sanseverino e Moura Ribeiro, para os quais o rol da ANS teria caráter meramente exemplificativo.
Com base nas balizas estabelecidas no julgamento, a Segunda Seção entendeu, no EREsp 1.886.929, que o plano de saúde é obrigado a custear tratamento não contido no rol para um paciente com diagnóstico de esquizofrenia, e, no EREsp 1.889.704, que a operadora deve cobrir tratamento para uma pessoa com transtorno do espectro autista, porque a ANS já reconhecia a terapia ABA como contemplada nas sessões de psicoterapia do rol de saúde suplementar.
Rol taxativo protege beneficiários contra aumentos excessivos
Em voto inicialmente apresentado no dia 16 de setembro do ano passado, e aditado no dia 23 de fevereiro deste ano, o ministro Luis Felipe Salomão defendeu que a taxatividade do rol da ANS é fundamental para o funcionamento adequado do sistema de saúde suplementar, garantindo proteção, inclusive, para os beneficiários – os quais poderiam ser prejudicados caso os planos tivessem de arcar indiscriminadamente com ordens judiciais para a cobertura de procedimentos fora da lista da autarquia.
Também de acordo com o relator, o respeito à lista garante que a introdução de novos fármacos seja precedida de avaliação criteriosa da ANS, especialmente em relação à eficácia dos tratamentos e à adoção de novas tecnologias em saúde.
Ainda que a lista seja taxativa, Salomão salientou que, em diversas situações, é possível ao Judiciário determinar que o plano garanta ao beneficiário a cobertura de procedimento não previsto pela agência reguladora, a depender de critérios técnicos e da demonstração da necessidade e da pertinência do tratamento.
Salomão também reforçou que, em nenhum outro país do mundo, há lista aberta de procedimentos e eventos em saúde de cobertura obrigatória pelos planos privados pelo sistema público. Ele lembrou, ainda, que a lista da ANS é elaborada com base em profundo estudo técnico, sendo vedado ao Judiciário, de forma discricionária, substituir a administração no exercício de sua função regulatória.
ANS reduziu prazo de atualização periódica do rol para seis meses
Em seu voto-vista, ao apresentar parâmetros para que a taxatividade do rol seja excepcionalmente mitigada, o ministro Villas Bôas Cueva lembrou que a ANS, ao elaborar a lista, deve considerar que a assistência suplementar à saúde compreende todas as ações necessárias para a prevenção da doença e a recuperação, manutenção e reabilitação física, mental e psicológica do paciente, observados os termos da lei e o contrato firmado entre as partes.
Segundo o ministro, a agência reguladora define o rol a partir de sucessivos ciclos de atualização, em prazo que foi reduzido de dois anos para seis meses. Para essa atualização, apontou, são levadas em consideração análise técnicas e de impacto orçamentário, além de receber sugestões de órgãos públicos e da sociedade civil.
"O que consta no rol da ANS – atualizado periodicamente, com auxílio técnico e participação social e dos demais atores do setor –, são procedimentos mínimos obrigatórios para tratar doenças catalogadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e que devem, necessariamente, ser oferecidos pelas operadoras de planos de saúde. Todavia, essas são exigências mínimas obrigatórias, não sendo vedada a contratação de coberturas ampliadas", afirmou.
Para o magistrado, o modelo de saúde suplementar adotado pela legislação brasileira é de um rol taxativo mínimo, devendo o consumidor ser esclarecido dessa limitação em todas as fases da contratação e da execução dos serviços para, assim, decidir entre as opções disponíveis no mercado.
Entretanto, o ministro Cueva apontou que essa posição não deve ser considerada absoluta. Ele destacou que a atividade administrativa regulatória é sujeita ao controle do Judiciário, a quem compete combater eventuais abusos, arbitrariedades e ilegalidades no setor.
"Desse modo, o Judiciário não pode ser conivente com eventuais ineficiências da ANS, devendo compatibilizar, em casos específicos, os diversos interesses contrapostos: operadora e usuário desassistido, saúde de alguns e saúde de outros (mutualidade), vigilância em saúde suplementar e atendimento integral a beneficiários doentes", completou o ministro.
Destaques de hoje
Plano de saúde é obrigado a fornecer medicamentos de uso domiciliar em certas circunstâncias
REGRA: em regra, os planos de saúde não são obrigados a fornecer medicamentos para tratamento domiciliar.
EXCEÇÕES. Os planos de saúde são obrigados a fornecer:
a) os antineoplásicos orais (e correlacionados);
b) a medicação assistida (home care); e
c) os incluídos no rol da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) para esse fim.
Assim, os medicamentos receitados por médicos para uso doméstico e adquiridos comumente em farmácias não estão, em regra, cobertos pelos planos de saúde. Isso porque, em regra, os planos de saúde (que integram o sistema da Saúde Suplementar) somente são obrigados a custear os fármacos usados durante a internação hospitalar. As exceções ficam por conta dos antineoplásicos orais para uso domiciliar (e correlacionados), os medicamentos utilizados no home care e os remédios relacionados a procedimentos listados no Rol da ANS.
O tema é tratado no art. 10, VI, da Lei nº 9.656/98
O art. 10 lista em seus incisos tratamentos, procedimentos e medicamentos que os planos de saúde não são obrigados a fornecer.
O inciso VI afirma que, em regra, o plano de saúde não é obrigado a fornecer medicamentos para tratamento domiciliar, ressalvado o disposto no art. 12, I, “c” e II, “g” da Lei.
O art. 12, I, “c” e II, “g” preveem que os planos de saúde são obrigados a fornecer antineoplásicos orais (e correlacionados). Confira:
Art. 10. É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médico-ambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, realizados exclusivamente no Brasil, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva, ou similar, quando necessária a internação hospitalar, das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde, respeitadas as exigências mínimas estabelecidas no art. 12 desta Lei, exceto:
(...)
VI - fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, ressalvado o disposto nas alíneas ‘c’ do inciso I e ‘g’ do inciso II do art. 12;
Art. 12. (...)
I - quando incluir atendimento ambulatorial:
(...)
c) cobertura de tratamentos antineoplásicos domiciliares de uso oral, incluindo medicamentos para o controle de efeitos adversos relacionados ao tratamento e adjuvantes;
II - quando incluir internação hospitalar:
(...)
g) cobertura para tratamentos antineoplásicos ambulatoriais e domiciliares de uso oral, procedimentos radioterápicos para tratamento de câncer e hemoterapia, na qualidade de procedimentos cuja necessidade esteja relacionada à continuidade da assistência prestada em âmbito de internação hospitalar;
Exceção 1: antineoplásicos
Antineoplásicos são medicamentos que destroem neoplasmas ou células malignas. Têm a função, portanto, de evitar ou inibir o crescimento e a disseminação de tumores. Servem, portanto, para tratamento de câncer. Existem alguns medicamentos antineoplásicos que são de uso oral e, portanto, podem ser ministrados em casa, fora do ambiente hospitalar. A lei prevê que esses medicamentos, se prescritos pelo médico com indicados para o tratamento do paciente, devem ser obrigatoriamente fornecidos pelo plano de saúde.
Exceção 2: medicação assistida (home care)
Se o paciente está em home care (tratamento domiciliar), o plano de saúde também será obrigado a fornecer a medicação assistida, ou seja, toda a medicação necessária para o tratamento e que ele receberia caso estivesse no ambiente hospitalar.
O home care significa fornecer para o paciente que está em casa o mesmo tratamento que ele receberia caso estivesse no hospital. Se, no hospital, o paciente teria que tomar o remédio “X” a cada 8h, este medicamento deverá ser custeado pelo plano de saúde, tal qual ocorreria se estivesse internado.
Obs: essa exceção é uma decorrência do fato de que o STJ entende que os planos de saúde podem ser obrigados a custear o home care.
Exceção 3: outros fármacos que sejam incluídos pela ANS como sendo de fornecimento obrigatório
A norma do art. 10, VI, da Lei nº 9.656/98 é voltada à operadora de plano de saúde, a qual, na contratação, pode adotar tal limitação. Esse dispositivo, contudo, não proíbe que a ANS (“órgão regulador setorial”) inclua determinados medicamentos como sendo de custeio obrigatório no rol de cobertura mínima assistencial, ainda que sejam de uso domiciliar.
Em suma:
É lícita a exclusão, na Saúde Suplementar, do fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, salvo os antineoplásicos orais (e correlacionados), a medicação assistida (home care) e os incluídos no rol da Agência Nacional de Saúde para esse fim.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.692.938/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 27/04/2021 (Info 694).
DOD Plus – informações complementares
Cobertura de home care por plano de saúde
João é cliente de um plano de saúde. Após ficar doente, ele foi internado no hospital, onde permaneceu por algumas semanas. Até então, o plano de saúde estava pagando todas as despesas. O médico que acompanhava seu estado de saúde viu que seu quadro clínico melhorou e recomendou que ele fosse para casa, mas lá ficasse realizando tratamento domiciliar (home care) até que tivesse alta completa.
Ocorre que o plano de saúde não aceitou, afirmando que, no contrato firmado com João, havia uma cláusula proibindo o serviço de home care. Segundo a operadora, apenas o tratamento hospitalar está incluído.
O plano de saúde pode ser obrigado a custear o tratamento domiciliar(home care) mesmo que isso não conste expressamente do rol de serviços previsto no contrato? Mesmo que exista cláusula no contrato proibindo o home care?
SIM. Ainda que, em contrato de plano de saúde, exista cláusula que vede de forma absoluta o custeio do serviço de home care (tratamento domiciliar), a operadora do plano será obrigada a custeá-lo em substituição à internação hospitalar contratualmente prevista, desde cumpridos os seguintes requisitos:
1) tenha havido indicação desse tratamento pelo médico assistente;
2) exista real necessidade do atendimento domiciliar, com verificação do quadro clínico do paciente;
3) a residência possua condições estruturais para fazer o tratamento domiciliar;
4) haja solicitação da família do paciente;
5) o paciente concorde com o tratamento domiciliar;
6) não ocorra uma afetação do equilíbrio contratual em prejuízo do plano de saúde (exemplo em que haveria um desequilíbrio: nos casos em que o custo do atendimento domiciliar por dia supera a despesa diária em hospital).
STJ. 3ª Turma. REsp 1378707-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 26/5/2015 (Info 564).
STJ. 3ª Turma. REsp 1537301-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 18/8/2015 (Info 571).
Bradesco condenado a ressarcir um cliente que foi vítima do 'sequestro do Pix' em São Paulo
O TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) condenou o banco a pagar R$ 31,7 mil, considerando uma indenização de R$ 26,7 mil por danos materiais, referente ao valor que não foi devolvido, mais R$ 5.000 por danos morais.
O empresário de 25 anos que entrou com a ação estava com um amigo dentro de um veículo estacionado no bairro Campo Limpo, na zona sul da capital paulista, quando foram abordados por dois homens armados em maio de 2021. Um dos criminosos assumiu a direção do carro e eles foram levados para uma praça com pouca iluminação.
Criminosos usam o Pix para transferir dinheiro de vítimas durante sequestros -
Refém dos assaltantes por cerca de 1 hora e meia, o empresário foi obrigado a fornecer as senhas de seu aplicativo bancário e a fazer transferências, além de entregar seu cartão para os criminosos. Ao todo, as transações somaram cerca de R$ 35 mil, mas a vítima conseguiu recuperar apenas R$ 8.605 dois dias depois do crime.
Segundo o advogado Fadi Georges Assy, o empresário foi obrigado a criar uma chave do Pix para fazer as transações, já que ele ainda não utilizava o serviço de transferências instantâneas. Ele também teve o cartão bancário utilizado na máquina de cartão dos assaltantes.
Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa do Bradesco informou que não comenta casos que tramitam na Justiça. Ainda cabe recurso.
Na ação, a defesa do Bradesco argumentou que não poderia se responsabilizar pelas transferências, já que o crime ocorreu fora das dependências das agências. O Tribunal de Justiça, no entanto, negou recurso do banco por considerar que seu sistema falhou ao não identificar as fraudes.
O desembargador Jairo Brazil, da 15ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP, manteve o entendimento da primeira instância, que garantiu responsabilidade efetiva do banco e entendeu que a "má prestação nos serviços bancários" contribuiu para o crime.
"Transações bancárias realizadas mediante coação dos criminosos, em curto espaço de tempo, em sequência e em valores consideráveis. Sistema de detecção de fraudes da instituição bancária falho, pois deveria ter acusado a realização das transações ilícitas e impedido as suas efetivações", diz trecho da sentença.
Representante do empresário, o advogado Fadi Georges Assy diz que a Justiça acatou o argumento de que o banco desrespeitou o Código de Defesa do Consumidor e entendeu que o caso se enquadrava na súmula 479 do STJ (Superior Tribunal de Justiça), que define que as instituições financeiras precisam arcar com consequências relativas a falhas na segurança durante operações bancárias.
FolhaJus Dia
Assy diz que essa é uma das primeiras decisões favoráveis a uma vítima de crime de sequestro relâmpago e roubo de Pix. Segundo o advogado, na própria decisão judicial o desembargador citou casos semelhantes em que a Justiça julgou procedente a ação movida pelos clientes contra os bancos, mas que não envolviam a tecnologia de transferência instantânea.
"Entendemos que esse processo criou uma jurisprudência. A decisão também serve para reforçar a necessidade das instituições financeiras se modernizarem e oferecerem mais segurança", afirma.
Na ação inicial, a defesa do empresário havia pedido indenização de R$ 20 mil por danos morais.
quarta-feira, 27 de julho de 2022
Consumidor será indenizado após troca de relógio medidor de energia elétrica em sua residência.
Uma empresa concessionária de serviço público de energia elétrica foi condenada a indenizar um morador por danos morais, após a troca do relógio medidor de sua residência e cobrança de valores que levaram seu nome ao cadastro de devedores.
Segundo consta do processo, o consumidor era cobrado administrativamente de valores pela empresa, sob a alegação de irregularidade no relógio medidor de energia somente constatada após a troca do aparelho.
De acordo com a decisão do juiz, Dr. Frederico dos Santos Messias, da 3ª Turma Cível do Colégio Recursal de Santos “não se pode conceber, como dogma, a afirmação lançada pelo funcionário da concessionária quanto à constatação de fraude no medidor de energia voltada para os interesses da empresa, quando impugnada pela parte atingida”.
Segundo ainda decisão judicial, a prova pericial que apurou a irregularidade se realizou por iniciativa unilateral da empresa, não havendo prova válida da irregularidade e, por esse motivo, havendo o apontamento do nome do consumidor em cadastro de devedores, o dano moral é in re ipsa (presumido), devendo ser dado provimento ao recurso do autor para condenar a ré ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 5.000,00 (Cinco mil reais).
O funcionário examina o seu relógio e lavra um Termo chamado TOI - Termo de Ocorrência e Inspeção. Em poucos dias você recebe uma carta da concessionária de energia elétrica dizendo que seu medidor será examinado num outro município, e te convida a acompanhar a inspeção.
O convite é feito em um dia de semana onde a maioria de nós está trabalhando e provavelmente não irá.
Poucos dias depois o consumidor recebe uma carta chamada de - Comunicado de Cobrança de Irregularidade.
Esse comunicado informa que foram encontradas irregularidades ou seja, te acusa de ter realizado um "gato" e além disso, cobra uma multa altíssima que será incorporada na sua próxima conta de luz.
Saibam que, conforme a Súmula TJ Nº 256: O termo de ocorrência de irregularidade, emanado de concessionária, não ostenta o atributo da presunção de Legitimidade, ainda que subscrito pelo usuário.
Ou seja, o consumidor pode e deve contestar este TOI, realizado de forma arbitrária e unilateral, judicialmente.
quarta-feira, 20 de julho de 2022
Justiça obriga plano de saúde a pagar cirurgia de mudança de gênero
A Justiça paulista determinou que o plano de sáude da Notre Dame Intermédica Saúde arque com as despesas para a cirurgia de transgenitalização (alteração dos órgãos sexuais) de um cliente.
A decisão foi tomada pelo juiz José Francisco Matos em um processo movido por V.V., de 51 anos, que já obteve a mudança do seu registro civil.
No processo, ele afirmou que, durante anos, passou por tratamento hormonal para mudança corporal de gênero e que, em seguida, realizou uma primeira cirurgia para a retirada dos seios. Esse primeiro procedimento, afirmou, teve cobertura do plano de saúde.
Posteriormente, ele solicitou ao plano a realização de cirurgia de transgenitalização, com implante de uma prótese, mas não foi atendido.
"Os procedimentos pleiteados são necessários à saúde física e psíquica do autor [do processo], afirmou à Justiça a advogada Amanda Cardoso Naddeo, que o representa. "O gênero masculino já foi reconhecido. A cirurgia revela-se necessária para a vivência do gênero já reconhecido, não podendo prevalecer a negativa da operadora."
A Notre Dame disse à Justiça que o procedimento, chamado de neofaloplastia, apesar de ser previsto no rol da Agência Nacional de Saúde, possuiu cobertura obrigatória apenas quando há trauma no pênis, com necessidade de reconstrução.
"Os procedimentos requeridos são cirurgias meramente estéticas. Fato é que não há qualquer doença que indique a necessidade", declarou à Justiça. "O procedimento requerido tem a única e exclusiva função de embelezar o paciente e torná-lo compatível com o seu novo gênero", afirmou o plano, que sugeriu que a cirurgia poderia ser realizada pelo SUS (Sistema Único de Saúde).
Na sentença em que condenou o plano a arcar com as despesas, o juiz afirmou que "não se trata de questão puramente estética, mas de direito da pessoa transexual de se submeter a uma intervenção cirúrgica para conformar seu corpo ao gênero com o qual se identifica".
"O autor [do processo] comprovou que não se identifica com o sexo biológico, bem como o estresse psíquico e a vontade determinante de sua masculinização", declarou o magistrado na sentença, citando que V.V. apresentou relatórios médicos, psiquiátricos e psicológicos referendado a necessidade de passar pela cirurgia.
O juiz estabeleceu um prazo de 30 dias para que a cirurgia seja realizada.
A Notre Dame ainda pode recorrer da decisão.
Justiça condena banco Santander a pagar R$ 275 milhões por assédio moral
A 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região manteve a condenação do banco Santander, que terá que pagar indenizações que totalizam R$ 275,4 milhões por danos morais coletivos em razão de metas abusivas, adoecimentos mentais e práticas de assédio moral aos empregados.
As condenações são decorrentes de duas ações civis públicas movidas pelo Ministério Público do Trabalho contra o banco, que haviam sido julgadas parcialmente procedentes pelo juiz Gustavo Chehab, da 3ª Vara do Trabalho de Brasília. A decisão do TRT, tomada pela maioria da turma, é da última sexta (15).
Santander afirma que irá recorrer e acredita que a decisão será reformada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST). A empresa diz que "recebeu com surpresa a decisão, visto que os julgadores reconhecem as práticas da instituição no combate a qualquer tipo de assédio ou discriminação, como, aliás, já havia feito o juiz de primeiro grau".
Em seu voto, o desembargador relator, Dourival Borges de Souza Neto, afirma que "os diversos depoimentos transcritos na sentença dão nítida ideia do abalo emocional e psíquico impingido pela sistemática organizacional de fixação de metas de produção, mediante cobrança truculenta pelos gestores, seja diretamente ao empregado ou por meio de reuniões com exposição vexatória, cujas metas deveriam ser cumpridas a todo custo".
Segundo ele, "tais práticas impingiram os empregados a cometer atos irregulares para garantir a todo custo o cumprimento das metas, como comprar para si produtos do banco ou mesmo se aproveitar 'da boa-fé de clientes idosos pediram para ele comprar determinado produto e após o idoso assinar aumentavam a quantidade'".
Em sua avaliação, "os relatos prestados noticiam o grande número de empregados que foram acometidos de doenças mentais, transtornos psíquicos, síndrome do pânico, estresse e depressão".
O desembargador Grijalbo Coutinho afirmou, em seu voto, que "as provas produzidas revelaram a ocorrência de tratamento humilhante, inadequado e discriminatório no meio ambiente de trabalho".
"Na solução da presente controvérsia, interessa, antes de tudo, o bem-estar das pessoas e o respeito ao conjunto de atributos morais e éticos preservadores da dignidade humana, o que não foi observado pelo Banco Santander", avaliou o magistrado. "Não é possível fechar os olhos para a dura e crua realidade das relações de trabalho no Brasil, algo incompatível com qualquer ordem jurídica amparada em princípios democráticos."
Além do pagamento da indenização, que será revertida à coletividade, a decisão obriga o banco a não permitir, tolerar ou praticar, por seus gestores e prepostos, práticas que configurem assédio moral, como humilhações, xingamentos, ameaças de demissões, constrangimentos, coação, agressão e perseguição.
O Santander, em sua nota, "destaca o fato de a decisão não ter sido unânime, ou seja, dois juízes votaram para absolver inteiramente o banco da condenação".
Ambas decisões têm aplicação em todas as agências e em relação a todos os empregados do Santander no Brasil.
Ação inicial do MPT pedia indenização de R$ 460 milhões ao Santander
O Ministério Público do Trabalho ajuizou duas ações civis públicas contra o banco, em 2014 e 2017, após inquéritos civis mostrarem a pratica de assédio moral e outras violações aos direitos dos bancários. A condenação em primeira instância ocorreu em 2019.
Na ação de 2017, o Ministério Público do Trabalho demandou indenização no valor de R$ 460 milhões do Santander por danos morais coletivos. Afirmou que o banco adotava um modelo de organização do trabalho de seus empregados baseado na gestão por estresse e em assédios morais visando ao cumprimento de metas.
Segundo a ação civil pública, o banco adotava metas excessivamente elevadas e as aumentava constantemente, aplicando cobranças excessivas e sobrecarga de trabalho, mantendo empregados sob ameaça constante de demissão pelo não cumprimento das metas e descontando da produtividade quando clientes realizavam saques em aplicações financeiras.
Esse modelo de metas abusivas, de acordo com o MPT, tem levado a prejuízos também aos consumidores - que acabam sendo vítimas de vendas casadas "empurradas" ou outras práticas ilegais.
Empresas do sistema financeiro têm afirmado nesse tipo de ação que como as metas são aplicadas à parte variável do salário, que seriam um complemento, uma forma de bônus, e não à parte fixa da remuneração, o seu cumprimento não é obrigatório, mas facultativo. Uma das justificativas dadas para mostrar que isso não se configura assédio é que as metas aplicadas à parte variável se aplicam a todos os cargos, inclusive diretorias.
De acordo com o MPT, a política do banco teria causado danos à saúde de trabalhadores e ao erário público, pois afastamentos teriam representado um prejuízo milionário à Previdência Social.
'Pensado em dar fim à sua vida'
A ação civil pública traz uma avaliação psicológica realizada a pedido do MPT em agências do banco que concluiu que os bancários se encontram em níveis de sofrimento extremo em decorrência da organização e das condições do trabalho.
Em uma delas, de acordo com a ação, 43% dos empregados declaravam que "tem pensado em dar fim à sua vida". Outros resultados para a mesma agência eram: 43% sentiam-se inúteis em sua vida, 86% tinham dificuldade de pensar claramente e de tomar decisões, 100% sentiam-se tristes, 86% dormiam mal, 100% sentiam-se nervosos, tensos e preocupados, 86% assustavam-se com facilidade e 43% tinham tremores nas mãos.
A conclusão presente nos autos de infração lavrados pelos auditores fiscais do trabalho é de que "o estabelecimento de metas praticamente impossíveis de serem atingidas, seguido da cobrança pelo atingimento destas metas pelos superiores (...) trará a curto e médio prazo danos graves e irreparáveis à saúde dos bancários do Santander".
A aplicação de questionário para avaliação de condições de trabalho e saúde de bancários em uma outra agência apontou o seguinte resultado: 88% acreditavam que a meta de produtividade era excessiva; 66% sentiam-se muito fatigados ou sentiam pressão excessiva; 55% afirmavam que o cumprimento da meta prejudicava a sua saúde e a sua vida social; 100% tinham sentido, nos últimos seis meses, ansiedade em relação ao trabalho; 66% diziam que a cobrança era excessiva ou gerava constrangimento; 44% tinham sentido, nos últimos seis meses, dificuldades para dormir; 33% tinham tomado, nos últimos seis meses, remédios para ansiedade ou para dormir.
A ação trouxe depoimentos de empregados do banco colhidos em um inquérito civil pelo Ministério Público do Trabalho. Em uma das agências, um deles afirmou que o coordenador estava afastado em razão de tentativa de suicídio e acreditava que isso estava relacionado às condições de trabalho, uma vez que o coordenador não conseguia chegar perto de sua agência bancária.
Outro disse que pensava em bater a meta do momento em que acordava até quando dormia e que passou a apresentar problemas de saúde como distúrbios do sono, alteração do apetite, ansiedade, gastrite, síndrome do intestino irritado, crise de enxaqueca, crise de labirintite. Até que recebeu diagnóstico de depressão e síndrome do pânico, afastando-se, inicialmente, dez dias. Quando retornou, trabalhou por dez dias até teve uma crise de pânico durante o expediente.
Mais um informou que chegou a realizar operações bancárias para si próprio, visando atingir a meta. Para ele, o banco realizava cobranças excessivas sem assegurar condições para o cumprimento das exigências. Ele informou que, em razão das condições de trabalho, o gerente de pessoa jurídica de sua agência se afastou para tratamento de saúde, com diagnóstico de síndrome do pânico e depressão.
Outra depoente revelou que conseguia atingir as metas, mas trabalhava adoentada e que, na agência, todos os bancários estavam sob intensa pressão. Segundo ela, o gerente geral ameaçava de demissão em razão do não cumprimento das metas usando termos como "eu também sou cobrado", "lá fora não está bom", "não era o pior emprego do mundo". Para cumprir a meta de venda de produtos bancários, ela vendia aos sábados e domingos, em eventos sociais particulares, como churrascos.
domingo, 17 de julho de 2022
Reembolso por atendimento não credenciado só supera teto por recusa indevida
Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial ajuizado por uma operadora de plano de saúde, para desobrigá-la a fazer o reembolso total dos gastos efetuados por um de seus beneficiários durante uma viagem.
O consumidor estava em Poços de Caldas (MG), local que não possui rede conveniada ao plano de saúde por ele contratado, quando precisou ser internado e operado de forma emergencial. O tratamento custou R$ 29,5 mil.
As instâncias ordinárias entenderam que a operadora deveria arcar com o valor completo da internação e cirurgia, pois ela caráter emergencial. Para a empresa, essa posição fere o artigo 12, inciso VI da Lei dos Planos de Saúde (Lei 9.656/1998), que prevê as hipóteses de reembolso.
A norma diz que o pagamento será devido em casos de urgência ou emergência, quando não for possível a utilização dos serviços próprios, contratados, credenciados ou referenciados. E faz referência expressa à relação de preços de serviços médicos e hospitalares praticados pelo plano de saúde contratado.
Ou seja, o reembolso se limita ao montante que a operadora gastaria se o procedimento fosse feita na própria rede credenciada.
Relatora, a ministra Nancy Andrighi deu razão à operadora. Isso porque a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) previu na Resolução 259/2011, no artigo 9º, que o reembolso só deve ser completo quando descumprido o dever de garantia de atendimento.
Se o consumidor está na área geográfica de abrangência do contrato e, ainda assim, é forçado a procurar atendimento fora da rede credenciada por recusa injustificada ou descumprimento contratual por parte da operadora, nessa hipótese ele teria direito ao ressarcimento integral dos danos materiais causados.
“Noutra toada, se o beneficiário se encontra fora da área geográfica de abrangência e de atuação do produto, não há falar em obrigação de prestar assistência à saúde pela operadora, assim como também não há falar em indenização por danos materiais e, por conseguinte, em reembolso integral”, afirmou a relatora.
Segundo a ministra Nancy Andrighi, entender diferente ofenderia os artigos 8º, inciso VII e 16, inciso X da Lei dos Planos de Saúde, normas que autorizam as operadoras a delimitar a cobertura a determinadas áreas de abrangência. A votação na 3ª Turma foi unânime.
sábado, 16 de julho de 2022
Relógio de pulso com pulseira frágil: empresa condenada a indenização e um relógio novo
Tipo do Movimento: Sentença
-------------------------------
Trata-se de demanda proposta por-------------------- em face de NORTE GOLD JÓIAS EIRELLI e TECHNOS DA AMAZONIA INDUSTRIA E COMERCIO S A. A parte autora afirma que realizou a compra de um relógio, no valor de R$ 530,00. Alega que o produto apresentou vício. Não há que se falar em decadência, haja vista não se tratar de direito potestativo, mas pretensão de reparação de danos, sujeita ao prazo prescricional de 5 anos disposto no artigo 27 da Lei 8.078?90.
Rejeita-se a preliminar de falta de interesse de agir arguida pelo réu, vez que presentes a adequação e a utilidade da tutela pretendida pela autora. A preliminar de incompetência do juizado deve ser afastada, vez que a lide pode ser resolvida por meio de outras provas, que não a pericial, porque a perícia técnica, a rigor, é despicienda, na forma do artigo 33 da Lei 9.099/95, para o deslinde da causa, à luz da matéria fático probatória existente e das regras de julgamento aplicáveis. Presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, passa-se à análise do mérito da causa.
Constata-se, da análise dos autos, que o produto adquirido pela autora apresentou vício, durante o prazo de garantia legal. Com efeito, não se pode olvidar ter o Código Consumerista adotado a chamada teoria da confiança (Vertrauenstheorie), impondo a todos os fornecedores de serviços e/ou produtos da cadeia de consumo novos deveres anexos (Nebenpflicht), dentre os quais, o dever de qualidade, ou seja, de adequação do bem às expectativas legítimas dos consumidores. Dessa forma, caracterizada a inadequação do produto e/ou do serviço, surge para todos aqueles que participaram da colocação e/ou reposição do bem no mercado de consumo o dever de reparar o vício e indenizar o consumidor, propiciando o reequilíbrio e a paz social.
Na lição da ilustre Jurista Cláudia Lima Marques: "A doutrina brasileira mais moderna está denominando Teoria da Qualidade o fundamento único que o sistema do CDC instituiria para responsabilidade (contratual e extracontratual) dos fornecedores. Isto significa que ao fornecedor, no mercado de consumo, a lei impõe um dever de qualidade dos produtos e serviços que presta. Descumprido este dever surgirão efeitos contratuais (inadimplemento contratual ou ônus de suportar os efeitos da garantia por vício) e extracontratuais (obrigação de substituir o bem viciado, mesmo que não haja vínculo contratual, de reparar os danos causados pelo produto ou serviço defeituoso). A Teoria da Qualidade se bifurcaria, no sistema do CDC, na exigência de qualidade-adequação e de qualidade-segurança, segundo o que razoavelmente se pode esperar dos produtos e dos serviços. (...) A imposição deste novo dever legal tem seus limites definidos no CDC, o dever de qualidade liga-se ao princípio da proteção da confiança, confiança esta depositada pelo consumidor no resultado da atividade produtora do fornecedor, confiança esta despertada pela atividade do fornecedor, por seu produto ou serviço, como duas facetas da mesma realidade. (...) O princípio, no caso em exame, seria o da proteção da confiança, o da proteção das legítimas expectativas, contratuais e extracontratuais, criadas no mercado de consumo pela atividade dos fornecedores. Estes por sua atividade, e não só com a colocação de sua marca no produto, mas todos os que contribuíram para a colocação daquele produto no mercado, como técnicos, profissionais, prometeram uma obra isenta de vícios ou defeitos; nisto confiou o consumidor (contratante ou não)." (Marques, Cláudia Lima, in Contratos no Código de Defesa do Consumidor. O novo regime das relações contratuais. Ed. Revista dos Tribunais. 4ª edição. P. 984-987). E mais além: " (...)
Nesse sentido, parece-nos claro que o fim último da garantia de adequação instituída pelo CDC é o reequilíbrio da relação de consumo, especialmente da contratual, pois a garantia concentra-se no objeto do contrato, na sua prestação principal que é o produto ou o serviço adequado ao fim a que se destina. (...) Mas parece-nos que o fundamento, a origem primeira da garantia legal de adequação não é o contrato de consumo, mas a produção para o consumo, isto é, a participação do fornecedor na cadeia de bens destinados ao consumidor e a confiança que qualquer produto colocado no mercado desperta legitimamente no consumidor, um dever legal, um novo ônus, com base na obrigatória boa-fé do fornecedor no mercado. Seria uma garantia implícita (no sentido literal de implied warranty), garantia natural do produto, garantia que o acompanharia desde o seu nascimento, sua fabricação, mas que só poderia ser utilizada pelo consumidor; portanto, só após o contrato de consumo. Esta idéia de garantia como elemento do próprio produto poderia explicar porque todos os fornecedores são responsáveis por ela, e não só aquele que contratou com o consumidor.
Esta garantia implícita é mais do que a marca que o fabricante coloca no produto, a garantia é suportada por todos os que ajudam a inserir o produto no mercado (fabricante, distribuidor, montador e co-comerciante). A garantia, então, acompanharia o produto quando este fosse transmitido a sucessivos consumidores, durante a vida útil do bem, não importando se o vício oculto, por exemplo, em um forno de microondas, aparecerá no primeiro ano ou no segundo, quando já está em mãos da sobrinha da compradora original. Teria assim o CDC instituído não só uma garantia de funcionamento do produto, mas uma garantia até certo ponto de durabilidade." (Marques, Cláudia Lima, in Contratos no Código de Defesa do Consumidor. O novo regime das relações contratuais. Ed. Revista dos Tribunais. 4ª edição. P. 1011-1012). Assim, comprovada a inadequação do produto, durante sua vida útil e demonstrada a participação da ré na cadeia de produção e reparação do produto do autor e ausente a prova da ocorrência de qualquer causa excludente da responsabilidade objetiva da reclamada (v.g eventual fato exclusivo de terceiro), deve responder pelos prejuízos causados ao consumidor. Ante o contexto fático probatório apresentado nos autos deste processo, verifica-se que a hipótese se enquadra à previsão normativa do artigo 18 do Código de Defesa do Consumo, inclusive no que tange à solidariedade dos participantes da cadeia de consumo. Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas. § 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III - o abatimento proporcional do preço. § 3° O consumidor poderá fazer uso imediato das alternativas do § 1° deste artigo sempre que, em razão da extensão do vício, a substituição das partes viciadas puder comprometer a qualidade ou características do produto, diminuir-lhe o valor ou se tratar de produto essencial. Como se vê, a lei concedeu ao fornecedor o direito de solucionar o vício no prazo de 30 dias e, somente após esse prazo, caso não seja sanado, tem o consumidor direito ao concurso eletivo de ações previsto no dispositivo acima mencionado. Nesse cenário, o autor faz jus à a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso. Do exposto, resta evidente o dano moral, "in re ipsa", a ser compensado. O vício do produto, submetendo a autora à privação do bem, frustra a legítima expectativa, gerando ansiedade e angústia ao consumidor, que ultrapassam o mero aborrecimento.
Acresça-se a perda de tempo útil da autora. Os danos morais restaram configurados, decorrentes dos fatos acima narrados, os quais causaram ao autor transtornos e aborrecimentos passíveis de indenização, principalmente por ter que ajuizar a presente demanda para solucionar problema tão simples. Atento ao valor do bem, à capacidade econômica das partes, às consequências do ato e aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, fixo a indenização em R$ 1.500,00.
DISPOSITIVO Pelo exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos iniciais, com resolução de mérito, na forma do artigo 487, I do Código de Processo Civil, para condenar as rés solidariamente a:
1) promoverem substituição do produto objeto da presente lide por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso, no prazo de 15 dias, sob pena de multa única no valor de R$ 1.000,00.
2) a pagarem ao autor a quantia de R$ 1.500,00, a título de dano moral, com correção monetariamente pela tabela prática do egrégio TJRJ desde a data da homologação deste projeto de sentença, com juros de 1% ao mês a partir da citação.
Sem custas nem honorários, a teor do artigo 55 da Lei 9.099/95.
De acordo com o artigo 40 da Lei 9.099/95, submeto o presente à homologação do MM. Juiz de Direito, para que se produzam os devidos efeitos legais.
quinta-feira, 14 de julho de 2022
Correntista sofre golpes via pix e boletos, e banco terá de devolver R$ 60 mil
O Banco do Brasil foi condenado a devolver cerca de R$ 60 mil para a professora aposentada Inazeli Azevedo Nóbrega e Silva, 78, vítima de um golpe em julho do ano passado. Ela ainda deve receber mais R$ 10 mil em indenização por danos morais, após ter tentado alertar a instituição sobre as transações fraudulentas em sua conta.
O advogado de Inazeli, Fabricio Posocco, detalhou que um suposto funcionário do banco ligou para a idosa em julho de 2021 alertando sobre uma tentativa de acesso à sua conta, que teria sido feita por criminosos. O homem orientou a cliente a refazer os procedimentos de segurança da conta corrente ainda por telefone, confirmando diversos dados pessoais.
Depois, em outra ligação, ela foi orientada a ir até sua agência para realizar pessoalmente os procedimentos de segurança, sendo atendida por outro rapaz, funcionário interno do Banco do Brasil. Mas, ao sair da agência, ela foi pega de surpresa ao ter o pagamento negado nos cartões de crédito e débito em uma farmácia da mesma região, em Santos, no litoral de São Paulo.
Ao chegar em casa e abrir o aplicativo bancário, ela percebeu que, no primeiro contato com o falso funcionário, tinha sido alvo de uma ligação telefônica falsa. Os criminosos pagaram boletos, fizeram transferências via Pix e contrataram empréstimos no nome da idosa.
A decisão favorável a Inazeli foi tomada em primeira instância pelo juiz Frederico dos Santos Messias, da 4ª Vara Cível de Santos, mas ainda cabe recurso, segundo informação do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).
Ao justificar a sentença, o magistrado analisou os extratos apresentados pela defesa da professora e destacou que os gastos exorbitantes em um curto período de tempo eram incompatíveis com seu perfil como cliente.
"O banco deveria ter detectado as movimentações duvidosas e em desacordo com o perfil da autora. Porém, nada fez nesse sentido", argumentou Messias, destacando que faz parte do serviço prestado pelo banco perceber transações fora do padrão.
"A minha cliente é correntista de longa data, e seu perfil de consumo é de conhecimento da instituição financeira", declarou o advogado da idosa em nota, enviada ao UOL pelo seu escritório.
Além de receber os valores de volta e da indenização, a professora aposentada também fica livre de quitar dívidas feitas pelos golpistas e ainda pendentes em seu cartão de crédito.
quinta-feira, 7 de julho de 2022
Tribunal condena homem a indenizar a própria filha em R$ 7 mil por negar paternidade duas vezes
A 10º Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve, por unanimidade, a sentença de 1º grau que condenou um pai ao pagamento de indenização de R$ 7 mil à filha, por danos morais, após entrar com duas ações judiciais negando a paternidade.
Segundo os autos, ele reconheceu a filha após o nascimento e, depois, entrou com uma ação negando a paternidade. O processo, porém, foi encerrado porque o homem pediu o cancelamento, sem necessidade de exame de DNA, por ‘absoluta certeza’ da paternidade.
Dez anos depois, ele apresentou ação semelhante, sendo que um exame de DNA confirmou a paternidade.
O desembargador Márcio Boscaro, relator, entendeu que o dano sofrido pela filha é ‘inegável’.
“Conforme já salientado, pelas agruras padecidas em virtude de um lamentável posicionamento adotado por seu pai, o qual, depois de firmar, no bojo de ação negatória de paternidade que ajuizara, declaração em que reconhecia, indubitavelmente, a realidade dos vínculos biológicos paterno-filiais que os uniam, vir a ajuizar nova e idêntica ação, colocando em dúvida essa realidade, fato que, além de constrangedor, certamente acarretou muita angústia e humilhação à recorrida, caracterizando, assim, o efetivo padecimento de danos morais”, escreveu o magistrado.
Ainda de acordo com o relator, os fatos narrados no processo comprovam que a situação experimentada pela filha ‘indubitavelmente ultrapassou os limites do razoável e do mero aborrecimento’ atingindo sua ‘esfera moral’ e ‘dando inegável ensejo à reparação civil indenizatória’.
O entendimento do relator foi seguido pelos desembargadores Elcio Trujillo e Wilson Lisboa.
A decisão confirma a sentença de 1º grau, dada pela juíza Ana Flávia Jordão Ramos Fornazari, da 1º Vara Judicial de Pereira Barreto, no interior do Estado, dia 13 de janeiro.
A sentença fixou a reparação em R$ 7 mil, sendo que o valor solicitado pela filha era de R$ 15 mil.
Em seu despacho, a magistrada registrou que a filha afirmou ter sofrido humilhação ‘consistente em se submeter à coleta de exame de DNA após o pai ter desistido da ação proposta 14 anos antes com o mesmo objeto’ . Ainda segundo a moça, o pai falava em público que ela ‘não seria sua filha’.
Tribunal nega majoração de indenização a mulher que caiu da moto por causa de um gato que cruzou seu caminho
A 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina negou, por unanimidade, recurso movido pela ex- agente comunitária de saúde para aumentar o valor da indenização que vai ganhar, por decisão da Justiça, em razão de um acidente de moto durante o trabalho.
A mulher caiu de moto no dia 11 de junho de 2015 após um gato passar na sua frente e a deixar desequilibrada no horário de trabalho. O TJSC decidiu manter a condenação do município de Jaraguá do Sul – cidade de 184 mil habitantes a cerca de 190 quilômetros de Florianópolis – ao pagamento de R$ 10 mil por danos morais.
A decisão foi proferida no âmbito do recurso apresentado pela ex-agente comunitária contra decisão de 1º grau. No despacho, a juíza Candida Inês Zoellner Brugnoli, da comarca de Jaraguá do Sul, condenou o município de Jaraguá do Sul a pagar os R$ 10 mil por danos morais e mais R$ 472 por danos materiais, além dos tratamentos médicos futuros relacionados ao acidente.
Na ocasião, a magistrada considerou que o município tinha conhecimento do uso de veículo particular para realização de visitas periódicas dos agentes de saúde. “É possível concluir que, no caso específico da autora, em razão de circunstâncias adversas do local de atendimento, não era possível realizar as visitas a pé, tampouco cumprir a meta de visitas caso prescindisse de veículo próprio, já que não era disponibilizado veículo oficial, tampouco outra forma de transporte viável para atingir as famílias na área do Morro das Cabras, na localidade Tifa Schubert”, afirmou a magistrada.
Ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina, a ex-agente comunitária sustentou que o valor arbitrado em 1º grau ‘não parece razoável, devendo ser majorado, eis que o ocorrido trouxe sofrimento, bem como, consequências físicas irreparáveis’. Ela pediu indenização de R$ 399.584,00, o equivalente a 200 vezes a remuneração que ela recebia à época da apresentação da ação.
No entanto, o relator, desembargador Luiz Fernando Boller, entendeu que não havia necessidade de aumentar a indenização a ser paga no caso, considerando a ‘natureza, extensão e gravidade do abalo’ sofrido pela ex-agente comunitária. Segundo o magistrado, o valor não configura ‘quantia irrisória – sobretudo porquanto incidirão juros de mora e correção monetária -, tampouco em enriquecimento indevido ou ruína financeira’ do município.
“Deste modo, reputo razoável o valor de R$ 10 mil fixado para a indenização pelo dano moral suportado, pelos fundamentos já consolidados nos precedentes de nossa Corte, e principalmente porque a quantia cumpre a função punitiva, reparatória e pedagógica da respectiva indenização”, registrou.
Também foi negado o pedido de pensão vitalícia. O desembargador considerou que, estando a autora da ação ‘plenamente apta para o trabalho ao qual foi readaptada, na função como telefonista, não há que se falar em recebimento de pensão mensal vitalícia’.
Pedido de indenização em processo por dano climático
Pela segunda vez no Brasil, entidades ambientalistas estão ajudando a agravar na Justiça as ações dos órgãos fiscalizadores que visam punir os desmatadores ilegais da floresta amazônica também pelo dano que causam ao clima da região, do país e do mundo pela emissão de gases de efeito estufa, responsáveis pelos graves efeitos das mudanças climáticas.
O Observatório do Clima, instituição que reúne 37 entidades civis na discussão das mudanças climáticas no contexto brasileiro, entrou esta semana como parceiro da Advocacia-Geral da União (AGU) para agravar o processo judicial que o Ibama abriu contra proprietários rurais dos Estados do Pará e do Amazonas por desmataram ilegalmente 14 mil hectares de floresta, entre os anos de 2004 e 2017.
Nas três manifestações que anexou no processo judicial movido pelo Ibama, o Observatório do Clima cobra indenização no valor de R$ 247,3 milhões, que deve ser paga pelos desmatadores por causa dos danos que causaram ao clima com os gases de efeito estufa emitidos durante o processo de conversão da floresta em pastagens e lavouras.
Trata-se do maior pedido de indenização do gênero já feito no país. O primeiro pedido de indenização por danos ao clima se deu em 2021, quando o Ministério Público Federal (MPF) do Amazonas contou com a parceria do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) para cobrar R$ 44 milhões por dano climático causado naquele estado pelo desmatamento.
Segundo o Observatório do Clima, os desmatadores ilegais processados no Pará e no Amazonas são recorrentes na prática de desmates ilegais, acumulando multas do Ibama e devendo ressarcir a União em cerca de R$ 357 milhões por diversos diversos crimes. Os nomes dos desmatadores ilegais em questão não foram divulgados.
“Agora, além do dano ambiental causado pelo desmatamento e pelas queimadas praticados pelos réus, a União precisa cobrar também pelos gases de efeito estufa emitidos na conversão dessas áreas para pastagem e lavoura”, diz em comunicado a instituição Observatório do Clima.
A parceria que as instituições civis fazem com os órgãos de controle nos processos judiciais chama-se “amicus curiae”, termo que pode ser traduzido para “amigo da corte”, que é uma forma de intervenção de terceiro contida no novo Código de Processo Civil, na qual o interessado, caso tenha representatividade institucional, poderá participar do debate com o intuito de trazer uma solução ao conflito ou, ainda, formar um precedente.
O Observatório do Clima pediu para entrar nos processos como amicus curiae da Advocacia-Geral da União, que representa o Estado brasileiro nos processos. A instituição pretende apoiar o governo federal entregando dados complementares para subsidiar os pedidos de indenização feitos pela União em cada uma das ações.
O Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG), do Observatório do Clima, mostra que o desmatamento dos 14 mil hectares, a queima dos resíduos da floresta e o impedimento da regeneração das áreas desmatadas emitiram um total de 10,4 milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente (CO2e).
Esse volume de emissões equivale ao que é emitido em um ano pela Armênia e supera, por exemplo, as emissões da Costa Rica, por exemplo, segundo dados do ClimateWatch. Ao converter essas emissões em valor monetário, usando como referência o preço pago ao Brasil pelo Fundo Amazônia por reduzir o desmatamento (US$ 5 por tonelada), a equipe do Observatório chegou ao valor total de R$ 247,3 milhões, a serem exigidos nas ações.
Segundo o SEEG, o desmatamento é a principal fonte de emissões de gases de efeito estufa do país. Em 2020, último ano para o qual há dados disponíveis, o órgão calculou que a devastação das florestas, principalmente na Amazônia e no Cerrado, respondeu por 46% das emissões brasileiras. Somente a destruição da Amazônia emite mais que a Espanha e o Reino Unido somados.
Nas petições anexadas ao processo, o Observatório do Clima argumenta que, ao desmatar ilegalmente a floresta, os réus tornaram-se perpetradores diretos das mudanças do clima, que afetam um número cada vez maior de pessoas, em sua maioria pobres, a exemplo das 129 mortes registradas no fim de maio na Grande Recife.
“O dano ambiental é gênero, do qual o dano climático é espécie. Não se trata, então, apenas de desmatamento; se trata de desmatamento ilegal com a consequência concreta de aumentar a liberação de [gases de efeito estufa] e gerar desequilíbrio ecológico que se perpetuará por gerações”, afirmam a instituição ambiental.
“Há funcionários do Estado brasileiro que, à revelia do seu presidente, que apoia explicitamente a destruição, buscam fazer a coisa certa e responsabilizar os criminosos que destroem o patrimônio dos brasileiros e põem toda a humanidade em perigo. São esses servidores públicos que nós apoiaremos nos tribunais”, diz Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima.
segunda-feira, 4 de julho de 2022
Thiago Gagliasso é condenado a pagar R$ 10 mil por divulgar fake news.
Thiago Gagliasso, ator, influenciador e irmão de Bruno Gagliasso, foi condenado a pagar R$ 10 mil em indenização a Adriana Santana de Araújo Rodrigues, mãe de Marlon Santana de Araújo, um dos jovens assassinados na Chacina do Jacarezinho em maio de 2021.Thiago publicou em suas redes sociais uma imagem de uma mulher segurando fuzil e a entrevista dada por Adriana ao RJTV (TV Globo), alegando ser a mesma pessoa. A informação é falsa e foi desmentida pela polícia.
"É evidente que a publicação do Réu atingiu a dignidade da parte Autora, pois além de ironizar o luto pela perda do seu filho, mancharam sua reputação perante a sociedade vinculando-a ao crime. Ademais, o Réu é pessoa pública com grande quantidade de seguidores, o que facilita a propagação do conteúdo", decidiu o juiz José Guilherme Vasi Werner, do II juizado Especial Cível da Barra da Tijuca. Dessa forma, entendo que a importância de R$ 10.000,00 (dez mil reais) é adequada para compensar a autora, considerando as circunstâncias dos fatos, a condição econômica do Réu e da vítima. Outrossim, é procedente o pedido para que a se retrate, veiculando novas publicações informado o conteúdo desta sentença, bem como a desvinculado a imagem da parte Autora do vídeo em questão. Além do pagamento da indenização, o influenciador tem o prazo de cinco dias para se retratar em suas redes sociais, sob pena de multa diária de R$ 200,00, limitada ao teto de R$ 2 mil.
Políticos processam cidadãos
Fábio Barbosa de Souza soube da queixa-crime apresentada pela parlamentar pouco mais de dois meses depois de apertar o botão publicar. A parlamentar pedia sua condenação por calúnia e difamação, com penas que, somadas, poderiam chegar a dois anos de detenção, além de multa.
Processos como o sofrido por ele, movidos por autoridades em razão de críticas feitas por pessoas comuns, tornaram-se frequentes com a popularização das redes sociais e são mais uma demonstração de como o tema dos limites da liberdade de expressão está em disputa no país.
Frequentemente o Judiciário tem entendido que ocupantes de cargos públicos estão sujeitos a críticas mais contundentes do que a média.
Advogados ressaltam, por outro lado, que o fato de sofrer um processo já é punição para cidadãos comuns, que terão gastos com a defesa e precisarão lidar com a incerteza diante do desfecho do caso.
Outras duas pessoas que transcreveram a publicação de Fábio também foram alvos da queixa-crime da deputada –cada uma dessas duas postagens teve um compartilhamento; uma delas teve sete reações, e a outra, oito.
Fábio apagou a publicação. Pelo que lembra, diz, não chegou a ter 20 curtidas.
Mas o teor dela ainda pode ser conhecido, pois está na íntegra na decisão judicial. A postagem acompanhava uma notícia com o título “Parceria entre administração municipal e Aline Sleutjes garante perto de R$ 1 mi para pavimentação”.
“Vou compartilhar isso pras pessoas, principalmente os curitibanos, que se perguntam ‘Como os deputados bolsonaristas se elegem?’ Eles vem pedir voto no interior! Essa deputada, a mesma que apareceu no Jornal Nacional por conta dos rolos do PSL e que quase acabou com a Reserva Florestal de Piraí!”, dizia a publicação de Fábio.
Em seguida, ele apontava supostos erros da oposição. “Você acha que os piraienses ligam pra ideologia dela? só votam nela pq ela aparece aqui as vezes! Não tinha nenhum candidato de qualquer partido de esquerda ou centro-esquerda na eleição. Partidos de Esquerda dão votos a ela, pq esquecem do interior.”
Na queixa-crime apresentada contra Fábio e as duas internautas, a defesa da parlamentar dizia que “a honra e boa imagem são essenciais” para o trabalho de Sleujtes e que os ataques sofridos por ela “disseminam notícias falsas, tentando levantar hipóteses falsas e não comprovadas de modo a atingir a reputação da deputada”.
Pouco mais de quatro meses depois, o juiz Norton Thomé Zardo rejeitou o pleito, afirmando que não havia no post nada que ferisse sua honra e que o direito penal não abarca suposições como “quase acabou” com a reserva florestal.
“É de interesse comum dos cidadãos de determinado município saberem e discutirem acontecimentos que dizem respeito à vida pública e à atuação parlamentar de seus representantes”, concluiu.
O caso do professor está longe de ser único.
Embora não seja tão comum encontrar processos movidos por ocupantes do Legislativo ou Executivo federal contra pessoas sem projeção na mídia, ações do tipo movidas por autoridades municipais são mais frequentes.
Foi o que aconteceu com Alexandre Gonçalves, processado após crítica ao então prefeito de São Vicente (SP).
Na última semana do ano de 2019, quando tomava sol na praia, sua tia foi atropelada por um trator de empresa contratada pela prefeitura. Morreu dias depois.
Indignado, Gonçalves publicou em rede texto em que usou cinco vezes a palavra “assassino” para se referir ao ex-prefeito Pedro Gouvêa (MDB). Dessa vez, foram 350 curtidas.
Gouvêa foi à Justiça pedir a remoção do post e R$ 10 mil por danos morais. A remoção foi feita e, em primeira instância, foi-lhe concedida indenização de R$ 8.000.
Gonçalves recorreu, alegando que não houve dano e que o número de curtidas equivalia a 0,1% da população da cidade.
A desembargadora Ana Maria Baldy concordou com os argumentos e disse que “ainda que a crítica seja contundente e mal-educada, constituiu direito fundamental de todo e qualquer cidadão”.
De fato, os julgamentos deixam claro que assegurar a liberdade de crítica não significa nenhum aval à forma como ela foi feita.
“O mais importante é perceber que a manifestação do pensamento não deve ser protegida somente quando polida, sutil, delicada e bem construída. Não é razoável esperar que o cidadão comum formule suas críticas com a mesma sagacidade de Chico Buarque em Cálice “, escreveu o juiz Pedro Henrique Antunes Motta Gomes ao negar pedido da Prefeitura de Olímpia (SP) para condenar um morador por difamação em decorrência de uma live no Facebook.
“A proteção à manifestação da opinião, pensamento e crítica se faz necessária mesmo e principalmente se grosseira, desagradável, rude, mal formulada ou, especialmente, quando incomode detentores de poder”, acrescentou.
Mas há sim casos em que se entende que o cidadão comum cruzou uma fronteira que não se pode ultrapassar.
Foi o caso da crítica postada por Maria José Scamilla Jardim ao então prefeito de São José dos Campos Felicio Ramuth (PSD), hoje pré-candidato ao Governo de São Paulo, por reabrir o comércio em meio à pandemia de Covid-19.
Havia um detalhe curioso: Maria José é mãe de uma juíza que havia tomado decisão contrária à retomada de atividades no município. As postagens dela foram divulgadas pelo próprio Ramuth em sua página para desqualificar a decisão da filha.
A defesa de Maria José disse, então, que havia interesse político na ação. O Tribunal de Justiça acolheu parte da argumentação, mas não tudo.
Considerou que a expressão “capacho do empresariado”, usada por ela, não extrapolava os limites do direito à crítica. O mesmo entendimento não valia, porém, para o termo “vagabundo”, considerado ofensivo à honra.
Uma chave para analisar o limite entre a ofensa e a liberdade de expressão é a intenção, diz o advogado André Perecmanis, que atuou no caso do professor Fábio.
“Não basta que a fala seja ofensiva, é preciso mostrar que ela teve a intenção de macular a honra de alguém.”
Perecmanis integra o grupo Cala Boca Já Morreu, que é constituído por escritórios em parceria com o youtuber Felipe Neto com o objetivo de defender pessoas investigadas por proferir uma ideia ou crítica, desde que a fala não contenha incitação a violência ou a práticas antidemocráticas.
Em sua avaliação, houve um aumento significativo do número de ações do tipo em 2019 e 2020, início do governo Bolsonaro. Em sua percepção, à medida que o Judiciário assegurou o direito à crítica em muitos casos, o movimento arrefeceu.
sexta-feira, 1 de julho de 2022
Franqueador não responde pela morte de aluno de colégio franqueado, diz STJ
30 de junho de 2022, 15h44
Por considerar que o franqueador não pode ser responsabilizado por obrigações estranhas ao objeto da franquia, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu parcial provimento ao recurso especial interposto pelo Curso Objetivo para afastar sua responsabilidade civil pela morte de um aluno do Colégio Objetivo Mairiporã, na Região Metropolitana de São Paulo.
Aluno de Colégio Objetivo Mairiporã morreu em acidente de trânsito no qual foi reconhecida a culpa do transporte escolar fornecido pela escolaReprodução
O estudante faleceu após acidente de trânsito no qual foi reconhecida a culpa do transporte escolar fornecido pelo colégio (franqueado). Por unanimidade, os ministros consideraram que o serviço de transporte é desvinculado da franquia de metodologia educacional oferecida pelo Curso Objetivo (franqueador).
Segundo os autos do processo, o motorista dirigia em alta velocidade o micro-ônibus em que estavam as crianças quando desviou de um veículo que vinha na contramão e, em seguida, caiu em uma ribanceira.
Em ação indenizatória movida pelos pais do aluno falecido, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) condenou solidariamente o motorista, a dona do micro-ônibus, o Colégio Objetivo Mairiporã e o Curso Objetivo a pagarem R$ 500 mil por danos morais, além de pensão.
No recurso dirigido ao STJ, o Curso Objetivo alegou que não tem responsabilidade pelo dano causado, pois não há relação entre a franquia de metodologia educacional e o serviço de transporte contratado pelo franqueado de Mairiporã.
O TJ-SP havia entendido que, como o transporte escolar era fornecido pelo colégio, tanto o estabelecimento como o Curso Objetivo seriam responsáveis pela integridade física dos alunos, por integrarem a mesma cadeia de fornecimento do serviço educacional contratado pelos pais.
Ao analisar o caso, contudo, o ministro relator Raul Araújo afirmou que, para a jurisprudência da Corte, o franqueador somente responde de forma solidária com o franqueado pelos danos decorrentes dos serviços prestados em razão da franquia.
O magistrado ressaltou que, no caso dos autos, o que há é uma franquia de metodologia de ensino, em que o franqueado obtém lucro a partir da confiança que os consumidores têm nessa metodologia.
No entanto, o processo não discute a responsabilidade por falha na prestação de serviços educacionais, mas de serviço de transporte escolar contratado exclusivamente pelo franqueado, conforme reconhecido nas instâncias ordinárias.
Para Araújo, não é razoável considerar o transporte contratado pelo Colégio Objetivo Mairiporã como um serviço vinculado ao Curso Objetivo.
Com a decisão, a 4ª Turma reafirmou o entendimento de que o franqueador não pode ser responsabilizado por obrigações alheias ao objeto da franquia. Com informações da assessoria de imprensa do Superior Tribunal de Justiça.
Clique aqui para ler o acórdão
AREsp 1.456.249
Revista Consultor Jurídico, 30 de junho de 2022, 15h44
Assinar:
Postagens (Atom)