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sexta-feira, 27 de outubro de 2023
Turista morre após ida a hospital de Portugal e advogado brasileiro quer indenização milionária
O advogado brasileiro Alexandre Martins revelou ao Portugal Giro que a família do turista irlandês Robert Patrick Byrne vai processar o Hospital de Faro, unidade do Serviço Nacional de Saúde (SNS), por responsabilidade civil e danos morais. Os pais Sonya e Nicholas Byrne, com quem Robert morava, procuraram Martins porque entendem que o CHUA possa ter sido negligente com o filho. Segundo o advogado, o irlandês deveria ter sido encaminhado imediatamente para a Unidade de Cuidados Intensivos e realizado uma cirurgia de emergência.
— Estamos buscando a responsabilização profissional dos culpados e uma indenização de € 500 mil (R$ 2,6 milhões) por danos morais — disse Martins à coluna.
Robert recebeu o atendimento inicial às 10h35m sob a responsabilidade de uma médica, que assinalou a queixa no relatório: “Dor abdominal com início esta noite após consumo de bebidas alcóolicas e história de um episódio de vômito alimentar”. Em um segundo momento, às 12h26m, outro médico escreveu no relatório um último registro: “Exame objetivo com abdômen duro, depressível e com defesa abdominal. ABDÔMEN AGUDO ??”.
— Passou pelo médico e ficou abandonado na recepção (...) O médico ficou com essa dúvida do abdômen agudo, tanto que pôs as interrogações. Quero crer que o médico pôs a mão nele e examinou. Surgiu a dúvida, teria que encaminhar para exame complementar no centro cirúrgico. Pelo que está no papel, documentado, foi examinado pelo médico, que teve essa suspeita — contou Martins.
Houve duas chamadas para ele ir ao consultório médico: a primeira às 13h30m (três horas depois da entrada registrada) e 14h45m. Mas Robert, que segundo Martins disse, aguardava na recepção, resolveu deixar o hospital e voltar para a casa onde os amigos estavam, em Faro. Recebeu alta por abandono. Ele embarcaria no dia 17 de junho de 2022 para Dublin, onde foi constatado seu óbito no dia 18 de junho, logo após desembarcar, às 02h, do avião da Aer Lingus Airline, cia. aérea irlandesa.
Segundo Martins, com base no relatório da autópsia realizada pelos médicos do Connolly Hospital Blanchardstown, em Dublin, o quadro apresentado era de peritonite: “Há evidências de peritonite ao redor da raiz do mesentério e também alguma descoloração e inflamação ao redor da área ileocecal. O esôfago apresenta refluxo acentuado, esofagite biliar com manchas esverdeadas”, diz a autópsia.
A peritonite (inflamação do peritônio, membrana que envolve os órgãos) poderia ser uma das consequências da úlcera péptica perfurada, confirmada depois no relatório da autópsia como causa da morte.
— O hospital identificou, tanto que, no laudo o médico, coloca a suspeita da peritonite, dando a entender que era isso, pelos exames e pelo relato da equipe que foi (socorrê-lo) em casa. A negligência não foi no diagnóstico, mas no tratamento, que tinha que ser imediato. Peritonite tem que correr para o centro cirúrgico e não ficar três horas na recepção esperando. Houve retardo no tratamento — declarou Martins, que completou:
— É uma situação comum em Portugal o abandono de doentes na recepção do hospital.
O relatório da autópsia também revela que havia cocaína no organismo de Robert: “A morte é devido ao estresse metabólico de uma úlcera péptica perfurada e esofagite ulcerativa grave no contexto do consumo recente de cocaína”.
— Se o consumo de cocaína agravou, antecipou ou causou o quadro clínico dele, eu não sei dizer. Mas, independente disso, se ele chega no hospital e é diagnosticado com suspeita de peritonite, deve proceder a exames complementares e centro cirúrgico — disse Martins.
Ao ser questionado sobre quais os motivos que levaram Robert a deixar o hospital após três horas de espera sem que fosse concluído o atendimento, Martins declarou:
— O paciente é um leigo que não detém informação técnica suficiente para se posicionar diante da situação. Ele faz o contato com o SNS, que leva uma ambulância até onde ele se encontra, a equipe atende e leva ao hospital, caracterizando a emergência. Ele fica numa recepção durante três horas, sem falar português e ninguém explica nada a ele. Ele decide ir para casa. Se tivesse saído depois de cinco minutos ou meia-hora ou se tivesse sido informado e decidisse ir embora, haveria culpa concorrente. Não há, vai embora sem saber da gravidade do seu quadro.
Ao voltar para a companhia dos amigos em Faro, Robert permaneceu a maior parte do tempo deitado no sofá e precisava de ajuda para caminhar, mostram os vídeos feitos pelo grupo.
No aeroporto Gago Coutinho, em Faro, que também será alvo de processo, e onde, segundo Martins, foi negada a Robert uma cadeira de rodas, o turista irlandês teve que assinar um termo de responsabilidade garantindo que tinha condições de viajar Na foto feita por um amigo no aeroporto enquanto aguardava o voo, Robert aparece de cabeça baixa e debruçado sobre uma mesa na área dos restaurantes. Foi em posições parecidas que passou a maior parte do tempo desde que saiu do hospital.
O advogado informou, segundo relatos dos amigos de Robert, que ele teria falecido durante o voo, mas a morte só foi declarada em solo. Na resposta ao advogado, o departamento jurídico do aeroporto Gago Coutinho afirmou que Robert foi atendido no “posto de socorro às 22h50m de 17 de junho de 2022. De acordo com relatório médico, o passageiro informou à equipe médica que estava há três dias com vômitos, alguns deles com sangue escuro. Contou, ainda, que se deslocou ao Hospital de Faro, mas devido ao elevado tempo de espera, abandonou o mesmo sem ser visto”.
Ainda de acordo com o aeroporto, foi prestada “toda assistência médica necessária e possível naquele posto, tendo o passageiro sido informado que deveria ir ao hospital ser observado. O mesmo recusou sua ida ao hospital tendo assinado termo de responsabilidade. Não houve qualquer omissão da equipe médica, à qual não compete autorizar, ou não, o embarque de passageiros. Sendo o passageiro maior de idade e tendo assinado o termo, a equipe não poderia obrigar a ser internado”.
Procurado, o Ministério da Saúde informou que, por se tratar de caso específico, teria que ser respondido pela comunicação do CHUA. Contactada nos dois últimos dias, a comunicação não respondeu aos e-mails até o fechamento desta reportagem.
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