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segunda-feira, 10 de junho de 2024
Mercado de falências è cercado de suspeitas e ganhos milionários
Todo o processo de recuperação é fiscalizado pelo administrador judicial (AJ),
que é escolhido pelo tribunal que analisa os pedidos feitos pelas empresas. E as
remunerações deles podem chegar à casa dos milhões de reais.
Há quem descreva o setor, que passou a ser ainda mais disputado com a crise
econômica agravada pela pandemia, como uma "farra" de um clube fechado.
Os administradores recebem o dinheiro antes de a empresa pagar seus credores —
todos a quem a ela deve dinheiro, como funcionários esperando verbas rescisórias.
Hoje, a lei determina que a remuneração do AJ é de até 5% do valor da dívida
da empresa, e quem bate o martelo no valor é o juiz do caso.
O Executivo enviou ao Congresso um projeto de lei para atualizar as regras de
recuperações judiciais e falências — a relatoria incluiu ajustes para tentar impedir
práticas suspeitas.
Melhorias nesse campo são endossadas por promotores, STF, STJ e CNJ, mas há
ressalvas ao projeto de lei que tramita no Congresso.
Os advogados especialistas Rodolfo Salmazo e Luis Miguel Roa Florentin, do IDRE
(Instituto de Direito de Recuperação de Empresas), afirmam que o projeto de lei toma
por regra uma exceção: as RJs de valores bilionários.
Os supercasos são 37 recuperações judiciais e falências que, nos últimos dez anos,
superaram R$ 100 milhões cada uma. As dívidas dessas empresas, juntas,
ultrapassam R$ 250 bilhões.
Americanas, 123milhas, Oi e Samarco, por exemplo, têm ou tiveram
questionamentos sobre os honorários dos administradores dos seus casos.
O Ministério Público do Rio de Janeiro e os credores das Americanas contestam na
Justiça o pagamento de R$ 115 milhões aos AJs Sergio Zveiter, filho do ex-ministro
do STJ Waldemar Zveiter, e Bruno Rezende.
Foi citado nesse pedido o que ocorreu com a Oi: os administradores receberam R$
140 milhões na primeira RJ, em 2016 e, sete anos depois, a empresa pediu uma
segunda recuperação.
No caso Samarco, o MP de Minas Gerais chegou a pedir a redução da remuneração,
de R$ 500 milhões — no fim, ficou em R$ 50 milhões.
"Um absurdo, não tinha o menor cabimento", conta o promotor José Renato
Rodrigues Bueno.
O MP de Minas também agiu no caso 123milhas — é o recordista no país, com 800
mil credores. O processo ficou travado por meses devido a um impasse nas
nomeações de AJs.
A remuneração também foi questionada. A Justiça determinou R$ 64 milhões, mas
o MP recorreu, e o valor foi reduzido para R$ 34,5 milhões. A promotoria e a defesa
da 123milhas pedem para reduzir ainda mais.
Processos que resultam em pedidos de falência, como os da viação Itapemirim e da
usina São Fernando, da família Bumlai, também entram na mira. A reportagem teve
acesso a esses documentos.
O caso da Itapemirim foi parar no CNJ por suspeitas de conflito de interesse entre
magistrado, AJ e diretor jurídico da casa.
Na disputa da São Fernando, advogados pedem a suspeição do juiz César de Souza
Lima, acusado de favorecer o AJ Vinícius Coutinho.
Apesar de o valor da venda da usina ter previsão de demorar 17 anos para cair,
Coutinho já ganhou mais de R$ 15 milhões em honorários. Credores não receberam.
Coutinho diz que o juiz anterior do caso autorizou, por volta de 2017, a antecipação
do pagamento de seus honorários, pois é um caso de mais de dez anos (ele foi AJ na
RJ e na falência da usina).
O aumento de casos de recuperação judicial é uma espécie de sequela da
pandemia, diz o economista Luiz Rabi, do Serasa Experian. Para ele, uma bolha
estourou entre 2022 e 2023.
"Inflação alta, juros subindo, o efeito colateral foi a inadimplência de 72 milhões de
consumidores e de 6,7 milhões de empresas", analisa.
Parte dessas empresas precisou pedir recuperação judicial após a pandemia: a
maioria, médias e pequenas. A surpresa foi com a crise de gigantes do mercado.
Para cada um desses casos, um juiz indica um AJ para fiscalizar as operações das
companhias.
AJs, advogados e promotores ouvidos pelo UOL dizem que o mercado se tornou um
"clubinho".
Muitas vezes, os maiores casos vão para poucos escritórios escolhidos pelos
magistrados.
Advogados afirmam, no entanto, que se o juiz deve escolher um AJ em quem
confia para exercer a função, é natural que alguns nomes se tornem
recorrentes.
Entre os casos analisados, alguns administradores se destacam.
O advogado Arnoldo Wald foi indicado para as duas recuperações judiciais da Oi. Na
primeira, já concluída, recebeu honorários de R$ 70 milhões e pediu R$ 21 milhões
complementares, segundo publicado pelo colunista Lauro Jardim, do jornal "O
Globo".
Wald também está em outros quatro supercasos: 123milhas, Samarco, construtora
Galvão e incorporadora Rossi.
Quem também esteve no caso Oi foi Bruno Rezende, indicado para as recuperações
das lojas Leader e da MMX, de Eike Batista.
Junto de Sérgio Zveiter, ele atua nos casos das lojas Americanas (dívida de R$ 43
bilhões) e da cervejaria Petrópolis (R$ 4,4 bilhões).
Dídimo Inocêncio de Paula, desembargador aposentado, e Otávio de Paoli Balbino,
filho da desembargadora Marcia Balbino, foram nomeados juntos para dois
supercasos: 123milhas e Samarco.
Paula também foi nomeado para a indústria Ical e a multinacional Springs Global,
parceira da Shein no Brasil.
Oreste Nestor Laspro foi indicado duas vezes pelo juiz Leonardo Fernandes: no caso
SouthRock Capital (Starbucks), de R$ 1,8 bilhão, e no caso Ricardo Eletro (R$ 4
bilhões).
Fonte site UOL
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